Para entender o que você ganhou
e Eduardo Cunha perdeu
com o marco civil da internet
Fernando Brito
Republico um excelente e didático artigo de Ronaldo Lemos, na Folha/SP, edição desta quarta-feira(26), deixando bem claro o que estava em jogo, essencialmente, na votação do marco civil da internet, e os motivos pelos quais os dependentes da liberdade e da democracia em sua utilização estamos comemorando.
É um roteiro simples, bom para fazer entender àqueles que são pouco versados no assunto e que não conseguem acreditar que essa ferramenta esteja sendo disputada por tantos interesses econômicos e políticos.
E dá a medida de que não foi no núcleo do projeto que o Governo brasileiro cedeu para enfrentar a conspiração das teles, tendo à frente Eduardo Cunha.
Procure divulgar este texto a seus amigos.
A aprovação do marco civil não foi assunto de “interneteiros”.
Muito menos “moda” tupiniquim, ao contrário. Nos coloca na vanguarda da regulamentação de uma liberdade que, no mundo inteiro, tem de ser preservada de abusos e de censuras.
Ele tem a ver com o seu direito de acessar e de publicar o que você bem entender, desde que, claro, responda por isso, como é normal.
Mas você, apenas você.
Ninguém poderá decidir por você.
Saldo é positivo, e Brasil tende a influenciar novas regras nos EUA
Ronaldo Lemos - 26/mar/2014 - FOLHA DE SÃO PAULO
A Câmara finalmente aprovou o Marco Civil. Trata-se da lei que cria um rol de direitos e deveres com relação à rede e por isso foi chamada de “Constituição da Internet”.
A aprovação não foi fácil. A primeira redação começou em 2009, por meio de um processo colaborativo pela internet (do qual participei, vale dizer). Só que desde que o texto foi enviado ao Congresso, foram muitas as tentativas de votação, sempre adiadas.
O balanço é positivo. Por exemplo, foi assegurada a neutralidade da rede. Trata-se do princípio que garante que não haja discriminação de serviços nos bastidores da internet. Agora assegurada legalmente, ela impede que os fornecedores de acesso possam cobrar de empresas da rede para que seus sites carreguem mais rápido.
É o que está ocorrendo nos EUA com o provedor Comcast e o site Netflix. Por conta de um acordo de bastidores, o assinante da Comcast poderá acessar os vídeos do Netflix com melhor qualidade do que com outros provedores.
Isso prenuncia uma partilha da internet: cada site passa a buscar acordos com provedores específicos. Com isso a internet passa a se aproximar da TV a cabo. Esse cenário foi agora proibido no Brasil (como já havia sido também em outros países). Os EUA estão também revendo suas regras. A decisão brasileira deve ser influente por lá.
O próprio presidente do Netflix, beneficiário do acordo com a Comcast, veio a público dizendo que a internet sem neutralidade é insustentável. Com isso, o Brasil deu um passo importante, em boa direção, com relação à rede.
Um ponto importante é que as pontuais exceções à neutralidade serão reguladas por decreto presidencial, ouvida antes a Anatel e também o Comitê Gestor da Internet. Se a regulação tivesse sido deixada só à Anatel, seria basicamente técnica e isolada de maior escrutínio público. Da forma atual, o Executivo é o responsável político por qualquer passo em falso na regulamentação e o Comitê Gestor e a Anatel têm a oportunidade de contribuir no processo. É um bom modelo de freios e contrapesos.
Outro ponto em jogo dizia respeito à liberdade de expressão, protegida pelo artigo 20 do projeto. Por ele, os provedores somente poderão ser responsabilizados por conteúdos postados se descumprirem ordem judicial prévia exigindo sua retirada.
Isso afasta a possibilidade de censura prévia ou intervenção privada no que é postado na rede. Nos últimos dias, houve a ameaça de se modificar o artigo, o que faria com que os provedores se convertessem em verdadeira “polícia” do conteúdo. Felizmente a modificação não decolou.
Outra mudança foi a remoção da obrigação de localização de “datacenters” no país. Depois do caso Snowden, o Marco Civil ganhou um artigo adicional obrigando empresas a terem seus centros de dados fisicamente localizados no Brasil. Isso implicaria em aumento de custos e no risco de se afastar empresas estrangeiras do país, além de não resolver a questão da privacidade. O texto foi removido do projeto final.
Com isso, a Câmara desincumbiu-se bem de sua missão. A batalha continua agora no Senado. Aguarde os próximos episódios.
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