O coronel reformado que estarreceu o país na última terça-feira,25, ao revelar à Comissão Nacional da Verdade que matou, desfigurou e ocultou cadáveres de presos políticos durante a ditadura militar, ensinou técnicas de tortura a repressores gaúchos.
A reportagem é de Nilson Mariano, publicada no jornal Zero Hora-Porto Alegre, nessa
sexta-feira, 28-03-2014.
Malhães e o sargento Clodoaldo Cabral foram enviados porque o Departamento de Ordem Política e Social (Dops)não conseguia neutralizar a guerrilha. À meia-noite de 4 de abril de 1970, membros da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR) tentaram sequestrar o cônsul dos Estados Unidos em Porto Alegre, Curtis Carly Cutter. O americano escapou, ferido com um tiro no braço, mas o episódio acionou o sinal de alerta no CIE.
– Ele era duro, técnico, veio para fazer e para ensinar – diz Vargas, hoje com 78 anos.
Ex-vereador pelo antigo PTB de Leonel Brizola, o próprio Vargas diz ter sido torturado por Malhães no Dops – na atual sede do Palácio da Polícia, em Porto Alegre. Antes de sofrer choques elétricos até nos testículos, o oficial de estatura média e sotaque carioca o advertiu, sentado à frente:
– Isto aqui não é Câmara de Vereadores. Você deve saber que está aqui para prestar informações.
A tentativa de capturar o cônsul fustigara a parte sensível do regime implantado em 1964, a Doutrina de Segurança Nacional (DSN), avalizada justamente pelos EUA. O comandante da operação de sequestro, que prefere não se identificar por razões familiares, foi torturado depois de ser preso. Quando suas orelhas foram conectadas a fios condutores de energia, Cabral, o escudeiro de Malhães, anunciou o horror que viria:
Um especialista na solução final
O guerrilheiro foi levado ao lugar batizado de “A Fossa”, uma sala do Dops com os aparelhos de suplício e revestimento acústico nas paredes, para abafar os gritos dos torturados. Seria o equivalente à Casa da Morte, no Rio de Janeiro, onde Malhães executava prisioneiros. Aos 71 anos, o militante gaúcho lembra que os choques elétricos partiam das orelhas e corriam pelas sobrancelhas, como se rasgassem o cérebro.
Não apenas o malogrado sequestro incomodava a ditadura a ponto de mobilizar dois especialistas em “solução final” – matar e esconder o corpo. Naquele abril de 1970, bancos na região metropolitana de Porto Alegre estavam sendo assaltados, nas chamadas “expropriações” para financiar a guerrilha. Um dos envolvidos, Paulo de Tarso Carneiro, deparou-se com Malhães quando foi detido.
Num dos interrogatórios, Paulo de Tarso ouviu Malhães comentar que já estava havia 42 dias em Porto Alegre, torturando “esse bando de comunistas”. Usava óculos escuros, mas não cobria o rosto. Apreciava martirizar três ou quatro ao mesmo tempo, o que denominava “dança de São Guido” – ritual macabro da Idade Média.
– Fazia fila para torturar, não tinha pudor – conta o ativista.
Nenhum comentário:
Postar um comentário