Anos de Chumbo:
Comissão da Verdade identifica 17 centros de repressão clandestinos Brasil afora
Na chamada Casa Azul, em Marabá (PA), 24 militantes morreram, a maioria filiada ao PCdoB.
Marsílea Gombata 

Do AMgóes - Vários dos hoje 'bons velhinhos', celerados matadores 'bem mocinhos' décadas atrás, nos negros tempos da Ditadura, começam a perceber que seus filhos e netos podem pagar caro pela hedionda memória de pais e avôs, face à perspectiva de, inexoravelmente, suas verdadeiras faces macabras virem à tona, ao contrário da hipótese jamais pensada(como protagonistas de supostos 'crimes perfeitos', sem rastro para denunciá-los). Assim, como tem ocorrido mundo afora, passaram a dar com a língua nos dentes. A revisão da Lei da Anistia no STF é fator imperioso do Estado democrático de Direito ora no rumo da consolidação entre nós.
Marsílea Gombata
Maria Rita Kehl, Pedro Dallari, Heloísa Starling e Rosa Cardoso participaram da audiência
A Comissão Nacional da Verdade (CNV) identificou 17 centros clandestinos da repressão durante o período da ditadura. Com exceção de um, conhecido como a Casa do Ipiranga, na zona sul de São Paulo, todos eram palco de torturas e mortes de militantes contrários ao regime civil-militar.
Em audiência pública nesta segunda-feira-7, a pesquisadora Heloísa Starling, da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), apresentou sete locais que vêm sendo investigados pela CNV e outros dez que foram mapeados como antigos centros de repressão entre 1970 e 1975 no Estados de Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais, Goiás, Pernambuco, Sergipe, Ceará, Pará e Distrito Federal. Os centros estavam diretamente vinculados aos comandos dos órgãos de inteligência e repressão do Exército (Centros de Informações do Exército – CIE) e da Marinha (Centro de Informações da Marinha – CENIMAR), assim como organismos de natureza policial militar, como os CODI (Centros de Operação e Defesa Interna) e DOI (Destacamentos de Operação interna).
“Tanto a criação como o funcionamento regular são resultado de uma política das Forças Armadas”, afirmou Starling. “Não são estruturas autônomas, não são subterrâneas nem de milícias ou grupos paramilitares. Eram parte de uma estrutura de inteligência e repressão que obedecia ao alto comando das Forças Armadas.”
Além da CASA AZUL e da CASA DA MORTE, da qual apenas Inês Etienne Romeu saiu com vida, a CNV investiga a CASA DE SÃO CONRADO, no Rio de Janeiro; a FAZENDA 31 DE MARÇO, ao sul da represa de Guarapiranga, na Grande São Paulo; a CASA DE ITAPEVI e a CASA NO BAIRRO IPIRANGA, ambas em São Paulo, esta última que servia como centro de recrutamento de infiltrados para o Exército; além da CASA DO RENASCENÇA, em Belo Horizonte. Foram mapeados ainda os centros clandestinos CASA DE OLINDA, emOlinda/PE; CASA DA VILA MILITAR, em Goiânia; SÍTIO DE SÃO JOÃO DE MERITI, na baixa fluminense; CASA EM RECIFE; CASA EM FORTALEZA; SÍTIO ENTRE BELO HORIZONTE E RIBEIRÃO DAS NEVES/MG; FAZENDINHA, no município baiano de Alagoinhas; SÍTIO DO TRIÂNGULO MINEIRO; SÍTIO EM SERGIPE; e APATRAMENTO EM BRASÍLIA, no bloco 'J' da superquadra 104- Sul.
Segundo a pesquisadora, uma das colaboradoras da CNV, centros clandestinos eram propriedades privadas cedidas por proprietários que funcionava como órgãos de tortura e não podem ser confundidos com quartéis e delegacias. Ela explicou que esses locais tinham como atribuições a eliminação de pistas que levassem à identificação dos militantes presos, como digitais, arcadas dentárias ou mesmo dos próprios corpos, e as circunstâncias em torno da prisão, tortura e morte daquelas pessoas. “Os centros clandestinos não eram utilizados à margem do Estado, mas fizeram parte de uma política pública de tortura do regime”, observou o coordenador da CNV, Pedro Dallari. “Trata-se de um política de Estado e não apenas excessos ou acidentes.”
Conhecido como JC, em alusão a Jesus Cristo, pois tinha cabelos compridos e usava cavanhaque e crucifixo, ele serviu no DOI-Codi do II Exército, em São Paulo, sob o comando de Carlos Alberto Brilhante Ustra, provavelmente entre 1970 e 1972. Foi denunciado em uma ação civil pública movida pelo Ministério Público Federal, ajuizada em agosto de 2010, por casos de tortura, sequestro, morte e desaparecimento.

Presente à audiência, a ex-militante da ALN Darci Miyaki lembrou ter sido torturada mais de uma vez por Gravina. “O codinome dele era JC. Ele chegava na sala de tortura e dizia: ‘Eu sou Deus. Tenho poder de vida ou morte sobre você.’”
Segundo a advogada e membro da CNV Rosa Cardoso, Gravina “acha inconfessável o que fez no passado”. “O que ficou claro para nós é que ele vive o conflito de sentir que filhos e netos ficam envergonhados com o que fez.”
Forças Armadas. Peça fundamental no esclarecimento das violações de direitos humanos na época da ditadura, as Forças Armadas anunciaram na semana passada terem instaurado comissões de sindicância para investigar o uso de instalações militares para repressão e tortura. As sindicâncias, que haviam sido requeridas pela CNV em fevereiro, foram confirmadas no dia 1º de abril pelo ministro Celso Amorim ao telefonema a Dallari.
“Pela primeira vez há assunção do dever de investigar das Forças Armadas”, disse Dallari sobre a disposição dos militares. “Eu quero crer que em algum momento as próprias Forças Armadas tomem a iniciativa de patrocinar investigações dessa natureza.”
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