Os erros da Petrobras, de Dilma e a desonestidade intelectual da mídia
É curiosa a maneira como se desenvolve o jogo de slogans no mercado de notícias.
Com uma exceção, a entrevista de José Sérgio Gabrielli ao Estadão sobre o caso Pasadena bate integralmente com o depoimento de Graça Foster no Senado - ele, ex-presidente, ela, atual presidente da Petrobras.
Até analistas sérios têm batido na falsa tecla de que Gabrielli afirmou que era um bom negócio; e Graça garantiu que era um mau negócio. Virou o bordão repetido em todas as matérias e análises
Ambos disseram a mesmíssima coisa:
1. Em 2006, a compra da refinaria de Pasadena era um bom negócio.
2. Deixou de sê-lo a partir da crise mundial de 2008.
A exceção: Graça e a presidente Dilma Rousseff querem imputar a responsabilidade total do erro à diretoria executiva; Gabrielli pretende compartilhar da responsabilidade.
A crítica técnica
Houve um erro coletivo, sim.
Adquiriu-se a refinaria em pleno boom do mercado de commodities. Os dados apresentados, inclusive sobre o preço das refinarias, mostrava um aquecimento incomum do mercado em relação aos anos anteriores. O preço pago era inferior a média das negociações do período. Mas em 2005 a média das negociações era muito superior à média dos anos anteriores, sinal nítido que o setor passava por um momento de especulação.
A pergunta que não foi feita pelo Conselho: o que acontecerá com o investimento e a associação com a Astra se o mercado desabar e voltar, por exemplo, aos níveis de 2004. Simples assim.
Em todos os mercados, especialmente nos mercados de commodities, há uma preocupação permanente com o hedge, as formas de defesa contra grandes oscilações de mercado. É evidente que não passava ainda pela cabeça de ninguém que, logo depois, estouraria uma crise internacional da mesma dimensão da crise de 29. Mas havia sinais claros de que o mercado de commodities passava por um grande movimento especulativo, devido à ação dos fundos especulativos.
A Astra conseguiu seu hedge: a cláusula "put" - pela qual um dos lados poderia oferecer sua parte ao outro, de acordo com regras de precificação dos tempos de bonança. Ou seja, mesmo que o mercado desabasse, ela teria assegurado à sua parte o preço dos tempos de bonança. A Petrobras ficou com a broxa na mão. Mas só percebeu quando a Astra acionou a cláusula put.
Em toda operacao com poucos sócios, a regra de saída é elemento central de análise. Foi erro do Conselho não ter solicitado essas informações.
Foi um erro coletivo, sim, mas a que praticamente todas as grandes empresas de commodities estiveram sujeitas nesse período de intensa especulação.
Presidente da Vale, Roger Agnelli foi demitido pelo Bradesco devido às suas aventuras temerárias na aquisição de grandes minas com alto teor de risco. Na época, a velha mídia em bloco sustentando que sua cabeça tinha sido pedida por Lula. E bastaria conversar com os dirigentes do Bradesco para saber que foi a aventura de Simandou - muito pior que o caso Pasadena - que determinou seu fim.
No exterior, a Anglo American e a Rio Tinto meteram-se em desastres semelhantes, movidos pela corrida louca que marca tempos de especulação.
A pressão da corrida especulativa
Mesmo assim, não é fácil não entrar nessa corrida. Olha-se do lado, os competidores avançando, os grandes bancos de investimento estimulando com crédito barato ou planos de negócios favoráveis, o capitalismo mundial mudando, com o avanço das multinacionais de países emergentes.
Está-se em uma mudança paradigmática na economia mundial; ou no fim de um ciclo de especulação? Na bucha, no fragor do jogo, não tem resposta fácil. Se entra, arrisca-se a ter prejuízo; se não entra, arrisca-se a perder o bonde.
Tudo isso cria o caldo para as grandes apostas estratégicas, que podem dar certo ou não.
A Petrobras tem várias apostas que deram certo; e algumas que deram errado.
A criminalização de um erro de planejamento faz parte do jogo da oposição. E foi possível devido à atitude da presidente Dilma Rousseff de não se comportar como uma comandante, compartilhando do erro com os subordinados.
O que causa espécie é ver jornalistas sérios embarcarem nessa história de que as explicações de Graça Foster e Gabrielli são contraditórias entre si.
A insistência com que alguns jornalistas repetem essa farsa beira a desonestidade intelectual.
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