Queima de arquivo?

Um mês depois de depor e admitir   torturas durante ditadura, coronel é encontrado morto                                

Segundo familiares, casa de Paulo Malhães foi invadida

e morte se deu por sufocamento. Comissão pede que 

PF acompanhe investigação

Do AMgóes - A hipótese de 'queima de arquivo' é pertinente. Afinal, o coronel não suportou o 'cerco de consciência', acuado,  face a evidências apuradas pela Comissão Nacional da Verdade, que fatalmente chegariam a seu endereço, e deu com a língua nos dentes, com base na premissa dos oficiais de Hitler no Tribunal de Nuremberg(todos protestaram inocência, mas, à exceção de Goering, que se matou deglutindo uma cápsula de cianureto, os demais ali julgados acabaram na forca).                                                                                                           

Afinal, como copiou o  indigitado Malhães, 'peixe miúdo' no processo da repressão brasileira, as atrocidades nazistas - explicaram os  psicopatas do 3º Reich - foram deliberadas pelo  Führer. O agente do CIE confirmou, sob a aura de 'exato cumprimento do dever', em dantesca cena de repugnante cinismo na CNV, que trucidara 'tantos quanto foi necessário', indiferente às perguntas sobre quantitativo de seus 'justiçados' - um  'detalhe irrelevante', minimizou.                                                                                                                                        

As circunstâncias de sua morte - por sufocamento com  travesseiro - sem marcas de tiros ou sevícias - descartam em princípio, para especialistas em criminologia, a hipótese de assalto. Afinal, Malhães poderia 'escancarar' outras verdades estarrecedoras, complicando a vida de potenciais camaradas de farda, subalternos ou superiores. Assim, 'por via das dúvidas', terá sido mandado 'desta para outra pior', onde só há gritos lancinantes e ranger de dentes.             

Convenhamos: a confraria dos 'inofensivos velhinhos' de hoje, 'facínoras novinhos' décadas atrás, ora curtindo o ócio a débito  de nosso suor, disporá (alguém duvida?) de implacável código de 'ética', à base do 'entregou...morreu'. Detalhe verossímil: ele foi o 5º a ser inquirido na CNV e único a abrir o jogo, com riqueza de detalhes até então desconhecidos. Os quatro anteriores negaram tudo de pés juntos e, a exemplo do famigerado coronel Ustra, saíram cuspindo maribondo, na insana defesa da 'revolução redentora' de 1964.                                     

No mínimo, uma horda de psicopatas, transitando livremente entre nós,  reverenciados com as continências de praxe em fugazes visitas aos quartéis. Deplore-se, por humano sentimento de temperança, a par das cicatrizes indeléveis de cônjuges, herdeiros e parentes dos literalmente diluídos pela repressão, o trauma dos familiares desses torturadores, constrangidos a arrostar vida afora a nódoa indelével da barbárie que seus pais, sogros,  avôs, cunhados, tios e outros de correlata consaguinidade consumaram na 'guerra interna', não declarada(tempos da 'democracia' do 'Pra frente, Brasil!', 'Ame-o ou deixe-o') contra surreais 'delitos de opinião', agora expostos à execração no Estado democrático de Direito. por eles duramente  vilipendiado em duas décadas autoritárias, intimidando-nos com o aparato bélico bancado pelos tributos que diuturnamente recolhemos ao Erário.                                                

Os verdugos, apodrecidos e  com as mãos tintas de sangue, começam a cair, ainda que covardemente  silenciados pela 'lei do cão' de seus também decrépitos comparsas. A ver.             

                                                                  

DANIEL MARENCO/FOLHAPRESS

À CNV, Malhães afirmou que matou "quantos foram necessários" e confirmou crimes na Casa da Morte

São Paulo – O coronel da reserva Paulo Malhães, ex-agente do Centro de Informações do Exército (CIE), 76 anos, foi encontrado morto hoje (25) em sua casa, em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense. Há exatamente um mês, em 25 de março, ele deu depoimento à Comissão Nacional da Verdade (CNV) durante o qual admitiu ter participado de torturas, mortes e ocultação de corpos. À pergunta sobre quantas pessoas havia matado, respondeu, sem arrependimento: "Tantos quanto foi necessário".

Segundo o jornal Extra, investigadores da Divisão de Homicídios da Baixada Fluminense informaram que três homens invadiram a residência de Malhães na tarde de ontem (24). Ele teria ficado em poder dos bandidos das 13h às 22h. "A princípio, ele foi morto por asfixia. O corpo estava deitado no chão do quarto, de bruços, com o rosto prensado a um travesseiro. Ao que tudo indica ele foi morto com a obstrução das vias aéreas", declarou ao jornal o delegado Fábio Salvadoretti.

No depoimento, Malhães, ao comentar seus atos, disse ainda que "não tinha outra solução". Ao admitir que atuava na chamada 'Casa da Morte', em Petrópolis (RJ), também não estimou quantos presos políticos foram assassinados no local. "A casa não era só minha", argumentou. Segundo ele, o local era mantido com recursos do Exército.

O militar também confirmou ter participado da chacina do Parque Nacional do Iguaçu, em 1974, quando cinco militantes foram executados. Eram liderados pelo ex-militar Onofre Pinto, morto dias depois. Todos estão desaparecidos até hoje. Mas recuou de declarações dadas à Comissão da Verdade do Rio de Janeiro e ao jornal O Dia, sobre participação na operação para retirar o corpo de Rubens Paiva de uma praia no Rio. E afirmou não saber o destino do corpo.

Contrariando o que disse o delegado, o coronel Brilhante Ustra, apontado como torturador por entidades de direitos humanos, escreveu em sua página na internet que Malhães foi assassinado por quatro pessoas, que teriam dado quatro tiros no ex-militar. Posteriormente, Ustra postou reportagens dos jornais O Globo e Extra, que trazem a notícia sobre possível asfixia. "Postei no site apenas o que soube. A primeira informação  é que seriam quatro homens e quatro tiros", diz mensagem assinada por Joseíta Ustra, mulher do coronel e responsável pelo site, lembrando que posteriormente novas informações foram acrescentadas. "Estamos tão interessados em postar a notícia correta como o senhor."

O coordenador da CNV, Pedro Dallari, telefonou para o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, e pediu que a Polícia Federal acompanhe as investigações da Polícia Civil do Rio de Janeiro. Em nota, a comissão afirma que o crime deve ser investigado "com rigor e celeridade", face a eventual conexão com as revelações feitas por Malhães. "Por se tratar de uma situação que envolve investigação conduzida pela CNV, que é órgão federal , pedi que a Policia Federal fosse acionada para acompanhar as investigações conduzidas pela Polícia Civil do Rio", disse Dallari.

Para o advogado e ex-deputado Luiz Eduardo Greenhalgh, trata-se mesmo de queima de arquivo. "O único militar torturador que contou o que fez e o que sabia foi assassinado. Queima de arquivo evidente", afirmou no Twitter.

De acordo com a Agência Brasil, o presidente da Comissão Estadual da Verdade do Rio de Janeiro, Wadih Damous, disse que a morte precisa ser investigada com rigor. "O coronel reformado foi agente importante da repressão política e detentor de muitas informações sobre a ditadura", comentou, para justificar a necessidade da apuração.

Confira os depoimentos de Malhães à Comissão da Nacional da Verdade: