domingo, 27 de abril de 2014

Um ato nada informal         

   Janio de Freitas         Folha de S. Paulo
 
 
                                                                                                                                   (Fotomotagem publicada no 'Conversa Afiada')

Ao repetir, sem necessidade, o seu pedido de investigação de um alegado telefonema de José Dirceu há três meses e 20 dias, a promotora Márcia Milhomens Sirotheau Corrêa comprometeu mais a Promotoria do Distrito Federal com procedimentos impróprios e suspeitos, extensivos ao Judiciário do DF.

No pedido anterior ao juiz da Vara de Execuções Penais e, como etapa seguinte, ao presidente do Supremo Tribunal Federal, a promotora fizera o uso anormal de coordenadas geográficas para indicar as localizações dos celulares a terem seu uso investigado. As coordenadas, como constatou o advogado José Luis de Oliveira Lima, defensor de José Dirceu, correspondem à prisão da Papuda e ao Palácio do Planalto (viu-se, depois, que permitiriam violar também os celulares do Congresso e do Supremo).

O novo pedido não usa coordenadas geográficas. Refere-se ao Centro de Internamento e Reeducação, setor da Papuda, e "à área objeto das coordenadas mencionadas". Logo, além do reconhecimento objetivo da não inconveniência de citação nominal, a promotora confirma o propósito de devassar as ligações feitas e recebidas de todos os celulares do Planalto. E até do Congresso e do Supremo, já conhecida também sua presença na "área objeto das coordenadas mencionadas".

Fica atestada, portanto, a múltipla ilegalidade do recurso a coordenadas: a finalidade inexplícita e enganadora do seu uso, a quebra de sigilos telefônicos indeterminados e generalizados, e a violação de comunicações da Presidência da República -senão também do Congresso e do Supremo.

Não é preciso forçar a imaginação para antever o estado alucinante de "denúncias" e "acusações" que poderia ser criado com interpretações mal-intencionadas dos números movimentados por celulares no Planalto. O fundamento invocado pela promotora são "denúncias trazidas ao Ministério Público em caráter informal". Então, empatou. Denúncias em caráter informal dizem que a afirmação é falsa.


Mas, se as primeiras satisfazem a promotora, nem por isso o fato de subscrevê-las lhe serve de alguma coisa. Como já disse o ministro José Eduardo Cardozo, "situações de informalidade, de suposições, não permitem uma quebra de sigilo no Estado de Direito". Mas, sobretudo, as alegadas denúncias não justificam o uso de coordenadas capazes de induzir algo tão grave como a violação de comunicações originárias da Presidência da República.

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