quarta-feira, 14 de maio de 2014

Brasil, ano 14 

Mauro Santayana                              
        

(Revista do Brasil) - Desde a criação do calendário, pelos sumérios, há quatro mil anos, o desenrolar dos acontecimentos deixou de depender exclusivamente do acaso, para incluir feriados e eventos religiosos e políticos que passaram a datar e servir de palco para a história.

O Brasil, neste décimo quarto ano do milênio, contará com dois grandes marcos desse tipo: a Copa do Mundo e as eleições de 2014.

Eles contribuirão para chamar ainda mais a atenção da população mundial para um país que já é importante, por si só, globalmente. Com todos os nossos problemas, e o complexo de vira-lata de amplos setores da sociedade brasileira, somos o quinto maior país em território e população, o segundo maior exportador de alimentos, a sétima economia e o terceiro maior credor individual externo dos Estados Unidos.

Tudo isso obriga não apenas a que o Brasil não possa ser ignorado, mas faz, também, com que nosso país seja cobiçado, e esteja sendo ferrenhamente disputado, nos mais variados aspectos da economia e da geopolítica, pelos principais blocos, nações e empresas do mundo.

O crescimento da dimensão política e econômica da  Nação, nestes primeiros anos do século XXI, transformou o Brasil na bola da vez de uma permanente batalha, entre espoliação e independência, o modelo que prevaleceu nos últimos 200 anos - e outras visões de mundo, voltadas para a busca de caminhos alternativos para a construção do desenvolvimento econômico e social da humanidade.

As antigas potências coloniais e neocoloniais, que lutam para manter nosso país, ou amplos setores dele, sob sua influência, sabem que esse embate se dará, na economia, na política, na comunicação, e tem plena consciência do que esta em jogo, no Brasil, neste ano.

Na economia, e de se esperar, que elas reforcem, nos próximos meses - sempre com a dedicada ajuda da grande mídia - o discurso de esvaziamento da importância econômica do Mercosul; de valorização de mitos neoliberais como o da Aliança do Pacífico; de fragilidade dos fundamentos de nossa macro economia; da existência de um suposto protecionismo brasileiro, teoricamente responsável pela diminuição de nosso percentual de participação no comércio mundial - para o qual só haveria um remédio - estabelecer rapidamente acordos de livre comércio com os países mais ricos.

Essa é a estratégia que deverá ser aprofundada nos próximos meses. Pressionar o país permanentemente, apresentando cada eventual percalço como fruto de um suposto afastamento, no sentido econômico e político, do Brasil com relação aos países “ocidentais”.

Assim, enquanto a mídia - nacional e internacional – distrai determinadas parcelas da opinião publica, com alertas sobre a Argentina, Nicolás Maduro e a “bolivarianização” do Brasil e do Mercosul, os EUA e a Europa aproveitam para avançar sobre nosso mercado interno, aumentando, como fizeram em 2013, seus superávits em 50% e 1.000%, respectivamente, para 11,4 e 5,4 bilhões de dólares.

As potencias ocidentais e aos seus prepostos não interessa divulgar que elas diminuíram quase que na mesma proporção suas importações de produtos brasileiros no ano passado.

Como não é conveniente ressaltar, também, o fato de que, no comércio com países “bolivarianos”, como a Venezuela e a Argentina, tivemos um superávit somado de mais de 10 bilhões de dólares em 2013, sem o qual teríamos tido um enorme deficit balança comercial.

O mesmo esforço, de distorção e manipulação, continuará ocorrendo, neste ano, com a “glamourização”, da Aliança do Pacífico, pseudo organização fomentada pelo México com a ajuda dos EUA e a Espanha, como a última limonada do deserto em termos de associação comercial. A situação real da AP é tão boa, que seu maior expoente - justamente o país de Zapata – teve um crescimento de 1,2% no ano passado, menos da metade dos 2,5% estimados, no mesmo período, para o Brasil.

Obedecendo á mesma estrategia, os meios de comunicação europeus e norte-americanos - secundados pela mídia conservadora brasileira e latino-americana - subirão o tom de sua campanha contra os BRICS, aproveitando momento em que  o Brasil ocupa a Presidência de turno, e organiza, como anfitrião, a Cúpula Presidencial que reunirá os lideres do Brasil,  Índia, China e Africa do Sul, em Brasilia, em junho deste ano.

Naturalmente, como ocorre com o nosso comércio com países como a Venezuela, a grande mídia devera ocultar ou relativizar a informação de que, nos últimos 12 meses, além  do Mercosul, foi também para a China, e não para os países ocidentais, que aumentamos fortemente nossas exportações, em 10,4%, e nosso superávit, para quase 9 bilhões de dólares.

Considerando-se o que estão ganhando por aqui, é natural que aumentem, também neste ano, as pressões favoráveis a uma rápida assinatura de um Acordo Comercial entre o Brasil – com ou sem Mercosul – e a União Europeia, o que abriria as portas para futuro entendimento desse tipo com os próprios EUA.

Essa é uma hipótese que o Brasil terá que analisar sem pressa e com todo o cuidado. Somadas as remessas de lucro, estimadas em 24 bilhões de dólares em 2013, e o déficit de 26 bilhões no comércio exterior, apenas com a Europa e os EUA, já estamos contribuindo - sem ter assinado ainda esse acordo de livre comércio - com uma sangria de meia centenas de bilhões de dólares por ano para ajudar as potências ocidentais a enfrentar a crise em que se encontram.

Se compararmos esses 50 bilhões de dólares, com um ganho quase equivalente obtido pelo Brasil no comércio com  países emergentes - principalmente  América Latina, Caribe, BRICS e Mercosul - fica fácil perceber quem está nos espoliando, e com que tipo de parceiros é interessante nos associarmos, prioritariamente, no futuro.

Como está ficando difícil, para quem não abdica de continuar explorando, do jeito que puder, nossos recursos e mercado, colocar no poder governos direta e assumidamente alinhados com seus interesses, o objetivo, em 2014, continuará sendo sabotar institucionalmente o Brasil, mesmo que ele esteja gerando extraordinários ganhos.

A estratégia, nesse caso, passa não apenas pelo desmantelamento da imagem da nação do ponto de vista econômico, mas também pela promoção do caos, para dificultar a governabilidade, e colocar em questão, dentro e fora de território brasileiro, nossa capacidade de gestão e de realização. È essa linha de ação que alimenta a tese de que não estamos preparados para organizar grande eventos, como a Copa e as Olimpíadas, mesmo que, para fazer a omelete, quebrem-se alguns ovos, prejudicando também a imagem e a situação politico-administrativa de estados e municípios governados pela oposição, que estão envolvidos com a Copa do Mundo.

Não será de estranhar, portanto, se houver, nos próximos meses, infiltração, aproveitamento ou criação de novos “movimentos”, nos moldes dos rolézinhos, passíveis de se espraiar para as ruas, e eventuais ações voltadas para a intimidação do público turístico que nos visitará este ano, como a sabotagem dos sistemas de transporte e de hospedagem, o cerco a estádios, incêndios e fechamentos de ruas, etc.

A tudo isso, se soma a percepção, pelo cidadão comum, da ausência de um debate politico de melhor nível, que possa levar a discussão de propostas para a formatação de um novo projeto nacional.

Ate que ponto isso poderá influenciar a posição do eleitorado nas eleições de novembro?

O governo tem realizado avanços, mas, decide, cada vez, mais, sob pressão das circunstâncias, dos meios de comunicação, do Congresso, da aproximação das eleições e de uma base aliada fragmentada, cada vez mais preocupada com seus próprios interesses do que com a situação do pais.

E a criminalização da política - tema preferencial da grande mídia -  ajuda a distorcer ainda mais esse quadro, aos olhos do eleitor, nivelando todos os homens públicos por baixo e facilitando o trabalho de uma minoria radical, cada vez mais atuante, que odeia a democracia e sonha com a volta da ditadura e a derrocada do Estado de Direito.

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