segunda-feira, 26 de maio de 2014

Uma  estratégia  de     

isolamento do Brasil?


Júlio Miragaya, no Correio Brasiliense
                                  

                                                        

Brasil e México, embora separados por milhares de quilômetros, são países com muitas afinidades.
Brasileiros e Mexicanos são povos irmãos e não nos sai da lembrança a festa que os mexicanos fizeram em 1970 quando o Brasil sagrou-se tricampeão mundial de futebol.
Brasil e México são também os dois mais populosos países da América Latina, com 200 e 120 milhões de habitantes, respectivamente, e as duas maiores economias da região, com PIB respectivamente de 2,25 e 1,4 trilhões de dólares, representando, conjuntamente, quase 60% do PIB total latino-americano.
O México, como o Brasil, tem sua história marcada por momentos trágicos. Se aqui tivemos os portugueses massacrando milhões de indígenas e trazendo mais de 5 milhões de africanos na condição de escravos, o México vivenciou a tragédia do massacre perpetrado pelos colonizadores espanhóis, liderados por Hernán Cortés, que aniquilou o Império Asteca e dizimou mais de 8 milhões de nativos.
Mas o que nos distingue mais fortemente da realidade mexicana talvez seja a distância física da maior potência mundial, os Estados Unidos.
A proximidade com os EUA marcou profunda e tragicamente a história mexicana. Já país independente, livre do domínio colonial espanhol, o México teve surrupiado pelos norte-americanos, entre 1837 e 1853, nada menos que 55% de seu território, ou 2,41 milhões de km², o equivalente a mais da metade da área ocupada pelos 28 países que formam a União Europeia.
De uma nação com 4,38 milhões de km², passou a pouco mais de 1,97 milhão de km².
Sucederam-se outros momentos trágicos no México: a intervenção francesa e a humilhação da imposição do Imperador Maximiliano de Habsburgo entre 1864 e 1867; a ditadura sanguinária de Porfírio Diaz entre 1876 e 1911 e a Revolução Mexicana de 1910, liderada por Emiliano Zapata e Pancho Villa, vitoriosa em 1917, que promoveu uma ampla reforma agrária no país, mas deixou um saldo de 1 milhão de mortos.
A partir de janeiro de 1994, iniciou-se uma nova fase, com o México passando a integrar o Tratado Norte-Americano de Livre Comércio (NAFTA, na sigla em inglês), juntamente com os EUA e o Canadá.
Nesse período, o México tem sido utilizado pelo imperialismo norte-americano como uma espécie de aríete contra os demais países latino-americanos que buscam um caminho próprio, sem a tutela dos EUA, tendo sido um dos maiores incentivadores da Área de Livre Comércio das Américas (ALCA), e que foi refutada na 4ª Cúpula das Américas, realizada em 2005 em Mar del Plata.
Recentemente, formou com países sul-americanos, que seguem a cartilha econômica liberal (Colômbia, Chile e Peru), a Aliança do Pacífico, para se contrapor à proposta brasileira de formação da União das Nações Sul-americanas (UNASUL).
O distanciamento político de Brasil e México só tem se acentuado. Nesses 20 anos, a submissão da economia mexicana aos EUA aprofundou-se intensamente. Mais de 80% de seu comércio exterior é realizado com os EUA.
Em 2009, quando a economia dos EUA caiu 2,4%, reflexo da crise iniciada em 2008, a economia mexicana despencou 6,2%.
Se compararmos o desempenho das economias brasileira e mexicana a partir de 2003, quando Lula assumiu o governo e o México aprofundou seu receituário liberal com Vicente Fox, a disparidade é gritante.
A economia brasileira cresceu 45,44% nesses 11 anos enquanto a do México cresceu 30,71%.
Em 2013 o Brasil cresceu 2,3%, o dobro do México (1,1%).
A participação dos salários na renda é de 45% no Brasil e de 29% no México.
Nesse período, o Brasil criou 16 milhões de novos empregos formais e o México apenas 3,5 milhões.
Em 2013, o Brasil criou 1,4 milhões de novos empregos e o México meros 200 mil.
O Brasil reduziu a pobreza absoluta a 15,9% de sua população e no México ela aumentou para 51,3%.
Não obstante o desempenho sofrível, o México é tido como o “queridinho do mercado” e o Brasil, o “patinho feio”.
O curioso é que se os elogios ao modelo neoliberal mexicano são fartos, na hora dos capitalistas investirem seus dólares, parecem preferir o Brasil, onde os investimentos estrangeiros diretos saltaram de 16,6 bilhões de dólares em 2002 para cerca de 70 bilhões em 2012, enquanto no México refluiu de 24 bilhões para 15,5 bilhões no mesmo período.
Se o modelo liberal mexicano teve um desempenho tão inferior ao modelo “intervencionista e estatizante” brasileiro, a que se devem os elogios do mercado ao modelo mexicano?
Seria um ato de má fé, de fundamentalismo ideológico ou uma estratégia de isolamento do Brasil no cenário internacional?
Júlio Miragaya é presidente da Codeplan-DF e Conselheiro do Conselho Federal de Economia

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