Dilma é pop

Deve ter mesmo, como contam os mais próximos, ataques de braveza de assustar quem os vê de perto.
Mas no jantar que ofereceu a dez jornalistas da área esportiva, a presidente como quer esta Folha, ou a presidenta como prefere o colunista por ser português correto e da preferência dela, revelou-se mais para Dilminha, como a trata o ex-presidente Lula, do que para intimidante.
Ela foi a terceira presidente da República com quem conversei sobre as mazelas da gestão de nosso esporte.
FHC entendia a gravidade, mas tinha o FMI à sua porta. Mesmo assim escalou José Luiz Portella para dar à luz o Estatuto do Torcedor, que Lula veio a assinar como sua primeira lei.
Lula sabia tudo sobre a realidade do futebol, mas se deixou seduzir pelos encantos dos cartolas, sem perceber que só teria a ganhar caso rompesse com eles, embora diga que são um mundo à parte, contra o qual pouco se pode fazer.
A presidente não é, como FHC, tão bem informada, embora colorada e atleticana de coração, a ponto de "sumir" quando o jogo reúne o clube gaúcho, que ela adotou, e o mineiro, que trouxe de berço.
Mas soube ouvir. Surpreendeu-se com certos detalhes e foi firme ao exclamar que "a hora é essa!" ao perceber que o melhor legado que a Copa do Mundo pode deixar é a reforma de nosso futebol.
Simpática à ideia da liga dos clubes, entendeu que o papel da CBF deve se limitar à seleção brasileira e resolveu encontrar as lideranças do Bom Senso F.C. ainda antes da Copa. Não é pouca coisa.
Alegre, risonha, brincalhona, divertiu-se a valer com as provocações de Paulo Sant'Ana, do jornal "Zero Hora", mas arregalou os olhos quando ouviu que Vladimir Herzog veio da Croácia, cujo time será o adversário do Brasil na abertura da Copa.
Contou que até hoje sente dor quando ouve a música que marcou a Copa de 70, "Pra frente Brasil", porque a memória da tortura e da prisão associa uma coisa à outra. Nem por isso deixou de torcer pela seleção do mesmo modo que não acredita que algum brasileiro possa torcer contra hoje em dia.
"Nós ganhamos", enfatizou ao responder o que sentia ao ter que conviver com um cartola como Marin, que elogiou o delegado torturador Fleury: "Olho assim. Nós ganhamos. Eu não tenho vergonha de contar aos meus o que fiz. Não torturei ninguém. Eles é que têm. Nós ganhamos".
Derrotada mesmo, inapelavelmente subjugada, admite, só quando o embate é com o neto Gabriel. "Ai, não tem jeito. Já chego curvada, quase de joelhos".
Só faltou cantar um rock, embora tenha entoado o hino do Rio Grande do Sul.

Juca Kfouri é formado em ciências sociais pela USP. Com mais de 40 anos de profissão, dirigiu as revistas 'Placar" e "Playboy'. Escreve às segundas, quintas e domingos.
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