quinta-feira, 1 de maio de 2014

Rapazes do “FT”, leiam Charles
Dickens. Nós somos populistas ou vocês são monstros?

Fernando Brito                                       
oliver
Leio que os “sabe-tudo” do Financial Times chamaram de ”passo populista” o aumento de 10% anunciado pela Presidente Dilma Rousseff aos beneficiários do Bolsa-Família.
É preciso traduzir para os que acreditam nos jornalistas econômicos o que isso significa.
R$ 7 reais a mais por mês para a grande maioria, que recebe o valor básico, hoje de R$ 70 mensais. Ou uma moeda de R$ 0,25 por dia, assim mesmo faltando dois dias para completar o mês.
Mesmo os maiores benefícios, que são dados – meu deus! – aos que não têm renda mas tem cinco filhos pequenos e mais dois jovens de 16/17 anos, vão receber 36 reais a mais num mês, pouco mais que um real por dia.
Em nome de cada um destes desvalidos, o Brasil não dá um, mas  milhares de passos “juristas”. Por cabeça, paga mais de mil reais de juros por ano aos “homens bons” do capital, na forma de juros, sem que isso provoque críticas do mundo financeiro, exceto por ser ainda pouco.
Será que os “meninos” do Financial Times leram o grande Charles Dickens, um dos orgulhos da literatura inglesa?
Se não, trago um trechinho, para que lhes arda a consciência, da excelente tradução de Machado de Assis.
Os membros do conselho da administração eram homens profundamente filósofos.  Examinaram o asilo da mendicidade e descobriram repentinamente aquilo que os  espíritos vulgares nunca chegaram a descobrir; isto é, que os pobres nadavam em prazernaquele estabelecimento. As classes pobres, no pensar daqueles senhores, tinham ali  uma casa de recreio, uma taverna em que não se pagava nada, almoço, jantar, chá e ceia — em suma um verdadeiro paraíso de tijolos onde se gozava de tudo sem trabalhar. 
— Olé — disse o conselho consigo —, vamos pôr estas coisas em seus lugares; vamos acabar com isto.
Imediatamente estabeleceram como princípio que os pobres pudessem escolher (não se forçava ninguém) uma destas coisas: ou morrer de fome lentamente se ficassem no asilo, ou morrer de repente se saíssem para a rua. Para este fim contratou o conselho com a administração das águas uma quantidade ilimitada delas e com um mercador de trigo a remessa de um pouco de farinha de aveia em períodos determinados; concederam três pequenas rações de mingau por dia, uma cebola duas vezes por semana e a metade de um pão nos domingos. (…)  A princípio foi um pouco dispendioso o tal sistema; era preciso pagar mais à empresa funerária e apertar a roupa dos pobres que emagreciam descomunalmente depois de uma semana ou duas de mingau; mas o número dos habitantes do asilo de mendicidade diminuiu muito e os administradores estavam no sétimo céu.

Os nossos “membros do conselho de administração”, como o pró-homem de Aécio Neves, Armínio Fraga, que considera os salários atuais 'muito altos', deveriam receber um livrinho do Dickens.
Talvez, para gastar menos, pudessem assistir á versão cinematográfica, de Roman Polanski, porque talvez achem meio “arcaico” ler romances.
Um ou outro, que seja, para doer em suas almas, se as têm, “medidas impopulares” que sugerem.
Quanto a nós, que lendo ou não lendo Dickens, não aceitamos ver seres humanos passando fome, temos de perder o medo de dizer-lhes o que são, os “antipopulistas” que conseguem ter a coragem de reclamar de uma moedinha a um miserável.
Dizer-lhes que são monstros.

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