O prenúncio do desastre
iminente para um
desgastado 'hegemon'
José Carlos de Assis
Escrevi recentemente meu último artigo sobre política econômica até o grande desastre que se anuncia para a economia brasileira. Escrevo agora meu último artigo sobre política internacional por razões semelhantes: estou me tornando repetitivo e nada que eu, ou que qualquer outro analista de política internacional escrever poderá servir para o esclarecimento do processo de acelerada deterioração das relações mundiais e assim contribuir de alguma forma para a reversão de uma crise que está sendo levada ao paroxismo pelos Estados Unidos.
A marcha implacável dos neoconservadores norte-americanos é atrair a Rússia para uma guerra na Ucrânia a fim de esgotá-la economicamente. É uma insanidade, pois os Estados Unidos jamais poderão ganhar essa guerra. Contudo os precedentes são pedagógicos. Os Estados Unidos fizeram a guerra contra a Coreia e não conseguiram ir além de um empate; perderam a guerra do Vietnã; tiveram uma vitória de Pirro no Iraque e ainda estão atolados no Afeganistão. Ganhar, mesmo, no pós guerra, só uma vez: a conquista de Granada por Reagan.
Os episódios mais recentes da chamada Primavera Árabe, sob inequívoca responsabilidade norte-americana, desandaram em total desestruturação da Líbia, reversão para uma ditadura militar no Egito, confusão institucional, guerra civil e intervenção saudita no Iêmen e, como epifenômeno, a emergência do neo-califado chamado Estado Islâmico que adota técnicas de carnificina que só perdem para os bombardeios de napalm dos Estados Unidos no Vietnã. Ou seja, o Oriente Médio foi estraçalhado pela sábia “proteção” norte-americana.
Não há nada pior que um poder hegemônico em decadência. Na Guerra Fria, em função na especificidade sociológica dos países ocidentais e do Japão, os Estados Unidos exerciam, na sua parte do mundo, uma hegemonia benigna que atendia aos interesses objetivos das classes dominantes locais. Deles se poderia dizer que eram 'hegemons' no sentido grego, ou seja, no sentido de “liderança consentida”. Com exceção de Cuba, eles tiveram apoio da Europa Ocidental e do Japão para impor, se desafiados, sua política (exceto em Cuba).
A situação atual é nova, na medida em que o Estado norte-americano e sua classe dominante não dançam no mesmo ritmo. Seus empresários ganham dinheiro no mundo inteiro sob qualquer regime – haja vista o regime chinês -, mas os EUA racionalizam um poder estratégico que, querendo ou não, está dividido com a Rússia, potência nuclear desafiadora do seu poderio atômico. Diante disso, cambaleando em busca da afirmação da hegemonia perdida, os Estados Unidos buscam a aventura decisiva na Ucrânia.
Os atos recentes dos Estados Unidos no campo internacional, inclusive a intervenção na FIFA, são atos de escalada de guerra. Sua intenção é “melar” a Copa da Rússia em 2018, forçando os europeus e outros países vassalos a acompanhá-los a fim de pôr a Rússia de joelhos no cenário internacional. É uma guerra de desgaste do tipo das que precedem as guerras reais. Já citei aqui declarações de neoconservadores, hoje no poder nos Estados Unidos, predicando que o país não deveria aceitar jamais um outro rival do tipo da União Soviética. Eis a ação para isso.
Qual é a possibilidade de esse cenário mudar nos próximos meses? Nenhum. Mas, com base nos precedentes, os norte-americanos insistirão em manter a Rússia na corda bamba da iminência de um desafio militar. Como Putin é um notável estrategista, como bem demonstrou no caso da Crimeia, não creio que cairá na armadilha grotesca da Ucrânia e muito menos na provocação da Copa. Entretanto, seguirá a guerra de atrito norte-americana. Dela não tenho a menor intenção de falar nos próximos meses. Mesmo porque, a despeito das provocações, não há como tirar da Rússia o poder de fazer das ameaças americanas uma simples bravata.
Em termos das posições internacionais brasileiras, provavelmente não haverá qualquer novidade nas posturas divididas do Itamaraty, ora pendendo para uma linha independente, ora recaindo no servilismo aos norte-americanos. Também não haverá novidade na postura de 'quintas-colunas' como o ex-embaixador Sérgio Amaral, que usou ainda nesta semana a posição de presidente do Conselho Empresarial Brasil-China para atacar a aproximação brasileira com os BRICS e pregar, em discordância com relação à posição oficial brasileira, que nos devemos curvar indefinidamente ao que chama de reaproximação com os Estados Unidos, para quê não se sabe bem.
(*) J. Carlos de Assis é economista, doutor em Engenharia de Produção pela Coppe-UFRJ, ex-professor de Relações Internacionais da UEPB e autor de cerca de 20 livros sobre economia política.
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