No Rio, arrogância e prepotência ilimitadas de Cabral e Paes
Magaly Pazello(*), especial para o V I O M U N D O
Não pude desgrudar os olhos e ouvidos da transmissão ao vivo. Meu coração batia acelerado. Gás lacrimogêneo, spray de pimenta, armas de eletrochoque (taser), cassetetes, gritaria e porrada. Foi em total estado de estupefação e raiva que eu acompanhei a violenta remoção, por parte da tropa de choque da Polícia Militar, de profissionais da educação que ocupavam a Câmara Municipal do Rio de Janeiro.
Estando a mais de 400 quilômetros de distância só queria ter uma máquina de teletransporte para me materializar imediatamente bem ali no meio da cena dantesca autorizada por Sérgio Cabral — obviamente após consultar Eduardo Paes — a pedido de Jorge Felippe.
Queria me teletransportar carregando baldes de vinagre e leite de magnésio para aliviar o sofrimento de colegas que realizavam um ato pacífico de resistência à intransigência. E, também, tinta vermelha para pintar todo o edifício da Câmara com a mesma cor do sangue que jorrou de corpos escolhidos a dedo para servirem de exemplo. A noite do sábado, 28/09/2013, foi destinada ao espetáculo de perversão, prepotência e arrogância com que esse trio comanda o Rio de Janeiro.
Fui dormir somente muito entrada a madrugada de domingo. Pela manhã os jornais locais estampavam capas alienadas e indiferentes ao ocorrido. A invasão da PM para retirada “exemplar” daqueles que ocupavam o plenário da Câmara ocorreu após o fechamento das edições de domingo.
De qualquer forma estava tudo bem encaminhado, a visibilidade seria revertida para as intervenções da Prefeitura e do Estado na cidade em matérias sobre segurança e planejamento urbano, desviando o foco da truculência que Cabral e Paes já sabiam iria acontecer na noite anterior. Ou alguém acredita que chamar a tropa de choque resultaria em um exercício de gentileza e amabilidade?
Por que a “reintegração de posse” da Câmara não foi solicitada na mesma quinta-feira, 26/09, após os/as profissionais de educação declararem que iriam ocupar o plenário da Câmara até que o Plano de Carreira, Cargos e Remuneração apresentado pela Prefeitura fosse retirado, ou que houvesse, ao menos, um diálogo mínimo com a categoria a respeito do mesmo?
A ocupação ocorreu em função desse plano, ou melhor, da negativa sistemática da Prefeitura em dialogar com a categoria a respeito de um possível plano de carreira unificado. Afinal, uma demanda de muitos anos e que, além do mais, é um dos eixos reivindicatórios da greve dos profissionais de educação deflagrada no dia 8 de agosto.
Aliás, o plano de carreira só saiu por causa da greve. E a greve só foi deflagrada por que há anos tenta-se, sem êxito, o diálogo com a Prefeitura sobre as péssimas condições de ensino na rede pública.
O saldo final de tamanha vontade de meter o cassetete em quem não oferecia nenhum risco à segurança pública foi, segundo o Sindicato Estadual de Profissionais da Educação-SEPE, mídia tradicional e meios alternativos, foi este: pelo menos, 20 pessoas feridas encaminhadas ao Hospital Souza Aguiar, quatro professores detidos, sendo dois liberados apenas por volta das 5 da manhã do dia seguinte.
Também danos provocados pelos PMs ao forçarem a entrada, arrebentando cadeados e portas e empurrando as pessoas sobre os móveis da sala da plenária. Tudo isso debitado na conta dos profissionais de educação, pois, como todos sabem, vândalos usam como armas caneta pilot/giz, apagador e celulares.
Alguém até poderia dizer que foram poucas as vítimas sem nenhuma fatal…
Sim, é verdade. E teve alguém que se animou a defender essa perspectiva da ação policial: o comandante da PM!
Ele afirmou muito entusiasticamente que não houve nenhuma truculência, nenhum excesso, nem spray de pimenta nem nada, somente lá fora, um pouquinho, o necessário para dissipar…
Fotos publicadas no G1 desmentem isso e, inclusive, revelam o despreparo dos próprios policiais no manuseio desses artefatos. Vê-se claramente em uma das fotos que eles acabam jogando spray de pimenta nos próprios colegas, fogo-amigo entre policiais…
Quem não se lembra dos flagrantes de crianças de colo e até cachorros, recebendo spray, publicados nos jornais do Rio?
Toda essa ação foi transmitida ao vivo pela internet por valentes jovens integrantes da MídiaNinja, SEPE e professores que assumiram a tarefa de documentar a greve desde o seu início.
Um deles transmitiu diretamente de dentro da Câmara todo o corrido, ficando, assim, difícil sustentar as inverdades proferidas pelas “autoridades” e repercutidas pela grande imprensa como a de que profissionais da educação explodiram um coquetel molotov dentro da Câmara.
Pelas imagens víamos senhoras e senhores sentados na plenária quando houve a invasão da tropa de choque aos gritos.
Até mesmo os vereadores Reimont Otoni e Jefferson Moura foram agredidos por estarem ali e se recusarem a sair da frente, tentando proteger os/as educadores.
Integrantes do Black Bloc que acompanhavam pela internet, como eu, se solidarizaram e avisavam que já estavam correndo para o centro da cidade para ajudar os profissionais da educação.
Segundo relatos, esses jovens vieram portando uma arma terrível: leite de magnésia para aliviar os efeitos do spray de pimenta. Relembrando, em junho, várias pessoas foram presas, inclusive jornalistas, porque portavam vinagre consigo.
Como todos sabemos vinagre é uma arma de alta periculosidade, já taser e bala de borracha, não.
Relato de professor na comunidade Servidores Municipais do RJ:
Enquanto, diretores do SEPE ali presentes perguntavam ao policial onde estava a autorização judicial para a remoção, outros policiais ou sei lá o quê, fotografavam de modo bem arrogante as pessoas lá dentro, como se isso fosse necessário já que havia transmissão ao vivo 24 horas praticamente.
Falou-se numa autorização judicial expedida para aquele fim, mas não havia nenhum papel ou oficial de justiça para entregá-lo. Insistindo para que o mandado fosse apresentado, o policial por fim admitiu que não havia nenhum, pois, se tratava de ação “meramente” administrativa a pedido do governador e do presidente da Câmara.
Com a resistência dos ocupantes o choque entrou. Há documentação em imagem e som sobre o ocorrido além das transmissões que também ficam disponíveis. Os ocupantes resistiram até o fim.
A situação limite foi gerada pela prepotência do prefeito Eduardo Paes, o chefe da Casa Civil, Pedro Paulo, e a Secretária da Educação, Cláudia Costin. Durante mais de quatro anos o prefeito e a Secretária de Educação se recusaram a receber os profissionais da educação em audiência.
Cláudia Costin e Eduardo Paes mostram-se na imprensa como vítimas de uma manipulação política da oposição via SEPE, o que revela um simplismo analítico incrível, não por ingenuidade, mas por arrogância mesmo.
Não se trata de uma greve qualquer.
Os/as profissionais de educação do município do Rio a deflagraram após inúmeras tentativas de diálogo, sempre negadas e várias paralisaações que vinham ocorrendo desde o ano passado e foram se intensificando no decorrer do primeiro semestre de 2013. A decisão coletiva pela greve foi uma espécie de grito de socorro para a sociedade, um grito de pare!
É fundamental sublinhar que a categoria não realizava uma greve na rede municipal desde 1979. Foram, portanto, 19 anos! Vou repetir D-E-Z-E-N-O-V-E anos sem greve.
Não se trata, portanto, de atitude irrefletida ou tomada ao calor das manifestações de junho, ainda que estas tenham calibrado a reflexão sobre a conjuntura política.
Na primeira passeata pós-deflagração da greve 15 mil profissionais, embaixo de chuva fina, seguiram em passeata do largo do Machado ao Palácio da Cidade onde Educardo Paes decretou que naquele dia específico não haveria expediente.
Na passeata seguinte, havia um pouco mais de 15 mil, que caminharam da Tijuca à Prefeitura. E parecia que com tanta gente nas ruas, aproximadamente 80% da categoria parada, a população apoiando com chuva de papel picado, luzes piscando, bandeiras do Brasil tremulando nas janelas, buzinas, aplausos e dedões apontados para cima em sinal de positivo as negociações andariam no sentido de retirar o trio Paes-Costin-Pedro Paulo da torre de marfim e fazê-los descer ao solo da realidade.
Depois de muitas idas e vindas, ameaças de corte de ponto, exoneração, pressão das diretoras das escolas, foi acertado entre todas as demais reivindicações que o plano seria elaborado em consulta à categoria através do SEPE, desde que a categoria retornasse às salas de aula, isso foi feito, a greve foi suspensa e retornou-se ao estado de greve.
O acordo foi rompido pela Prefeitura que, após uma reunião com os 30 vereadores que formam a base do governo na Câmara, protocolou um plano confuso, redundante, obscuro sem qualquer consulta prévia ao SEPE.
O plano é tão mal escrito que gerou tamanho desconforto e desconfiança de que era melhor ter continuado como antes que a categoria voltou à greve.
E, na Câmara, em aproximadamente 5 dias 29 emendas foram elaboradas, além de correções ao texto terem sido inseridas pela própria Prefeitura, acrescentando-se também uma planilha.
Tão confuso tudo que a Prefeitura publicou no Diário Oficial mais de 40 perguntas e respostas sobre o plano na tentativa de esclarecer as pessoas já que uma enxurrada de perguntas foi feita diretamente ao trio.
A história é mais longa e com lances da ordem do absurdo. E merece ser contada em outro artigo a partir da análise dos entraves mais sérios entre todos os eventos que desenbocaram no beco estreito das posições entrincheiradas:
*A meritocracia — Bandeira de campanha de Eduardo Paes, orgulho de Cláudia Costin como método de modernização da educação e nova panaceia defendida por economistas neoliberais. É duramente criticada por educadores e especialistas em educação por promover atitudes antiéticas e mascarar, no final das contas, o flagelo da aprovação automática e da falta de autonomia dos/as professores/as.
* O emprego do dinheiro do FUNDEB – Saia justíssima do Prefeito. A transparência no emprego do dinheiro do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação.
*E as condições de infraestrutra das escolas – De um lado, Eduardo Paes alardeia construção de novas escolas, creches e centro educacionais. De outro, o Tribunal de Contas do Município cobra que das mais de mil unidades de ensino aproximadamente 150 tem condições de uso, todas as demais deveriam ser fechadas. Falta água, as salas são quentes e lotadas, banheiros são horríveis, as crianças não têm chuveiros para o banho após a educação física, inúmeras escolas não possuem quadras esportivas. Em outras tantas o reboco está caindo, há infiltrações, os muros podem cair, árvores precisam ser podadas, a parte elétrica corre risco de incêndio e por aí vai.
A greve não se concentrou em reivindicações salariais, mas nas injustas disparidades entre os diversos cargos, num plano de carreira unificado, ou seja, o documento que regula a vida funcional de toda a categoria, em questões pedagógicas, na política de educação desenhada para atender a interesses não necessariamente do desenvolvimento humano e social da população a qual se destina, nas péssimas condições de ensino seja infraestrutura ou na relação com as demais instâncias da Secretaria de Educação.
É um pacote muito mais amplo, por isso acenar com ajuste salarial de imediato não teve o resultado esperado de retorno às aulas.
Mas, a meu ver, algo é certo, Paes não teria se dado o trabalho de voar até a Prefeitura para fazer uma reunião com o SEPE, se não tivesse vislumbrado alguma rachadura nas estruturas de sustentação de seu edifício político.
Embora vaidoso como é, na primeira oportunidade e percebendo-se maior do que a situação resolveu que era hora de esticar a corda pensando que essa romperia no lado supostamente mais fraco (professores e oposição)
Bancários em greve se solidarizaram, até vereadores da base governista se manifestaram contra a remoção. Se as 40 perguntas e respostas foram como gasolina na fogueira, as manobras no regimento interno mais a remoção seguida de uma agradecimento público à PM na primeira página do site da Câmara serão o quê?
A segunda-feira, 30/09, desperta com uma lista interminável de atos por várias partes da cidade contra a violência gratuitamente endereçada a uma categoria profissional que vem organizando protestos pacíficos desde agosto.
Nesse último dia de setembro esperamos mobilizar um grande número de profissionais, mas sobretudo cidadãos e cidadãs que não permitem que a desfaçatez e a força bruta sejam colocadas em primeiro plano pelas instituições e representantes do Estado. E eu estou retornando ao Rio o mais rápido que eu puder, vou juntar a pleno pulmão, leite de magnésia e vinagre.
A tinta vermelha espero ter que usar somente para escrever os nomes daqueles que no sossego de seus lares dormiam tranquilamente o sono da certeza de que estão sobre a carne seca.
A sra. Claudia Costin, após vários dias sem o seu costumeiro hábito de utilizar o Twitter, escreveu muito alegremente, na manhã de ontem um “Bom domingo a todos!”
Para a senhora o que dizer além de que com isso ganhou o direito ao troféu desfaçatez do ano.
Em tempo: os profissionais da educação estudam as medidas judiciais cabíveis sobre a ação de resultou nas prisões e em feridos.
Estando a mais de 400 quilômetros de distância só queria ter uma máquina de teletransporte para me materializar imediatamente bem ali no meio da cena dantesca autorizada por Sérgio Cabral — obviamente após consultar Eduardo Paes — a pedido de Jorge Felippe.
Queria me teletransportar carregando baldes de vinagre e leite de magnésio para aliviar o sofrimento de colegas que realizavam um ato pacífico de resistência à intransigência. E, também, tinta vermelha para pintar todo o edifício da Câmara com a mesma cor do sangue que jorrou de corpos escolhidos a dedo para servirem de exemplo. A noite do sábado, 28/09/2013, foi destinada ao espetáculo de perversão, prepotência e arrogância com que esse trio comanda o Rio de Janeiro.
Fui dormir somente muito entrada a madrugada de domingo. Pela manhã os jornais locais estampavam capas alienadas e indiferentes ao ocorrido. A invasão da PM para retirada “exemplar” daqueles que ocupavam o plenário da Câmara ocorreu após o fechamento das edições de domingo.
De qualquer forma estava tudo bem encaminhado, a visibilidade seria revertida para as intervenções da Prefeitura e do Estado na cidade em matérias sobre segurança e planejamento urbano, desviando o foco da truculência que Cabral e Paes já sabiam iria acontecer na noite anterior. Ou alguém acredita que chamar a tropa de choque resultaria em um exercício de gentileza e amabilidade?
Por que a “reintegração de posse” da Câmara não foi solicitada na mesma quinta-feira, 26/09, após os/as profissionais de educação declararem que iriam ocupar o plenário da Câmara até que o Plano de Carreira, Cargos e Remuneração apresentado pela Prefeitura fosse retirado, ou que houvesse, ao menos, um diálogo mínimo com a categoria a respeito do mesmo?
A ocupação ocorreu em função desse plano, ou melhor, da negativa sistemática da Prefeitura em dialogar com a categoria a respeito de um possível plano de carreira unificado. Afinal, uma demanda de muitos anos e que, além do mais, é um dos eixos reivindicatórios da greve dos profissionais de educação deflagrada no dia 8 de agosto.
Aliás, o plano de carreira só saiu por causa da greve. E a greve só foi deflagrada por que há anos tenta-se, sem êxito, o diálogo com a Prefeitura sobre as péssimas condições de ensino na rede pública.
O saldo final de tamanha vontade de meter o cassetete em quem não oferecia nenhum risco à segurança pública foi, segundo o Sindicato Estadual de Profissionais da Educação-SEPE, mídia tradicional e meios alternativos, foi este: pelo menos, 20 pessoas feridas encaminhadas ao Hospital Souza Aguiar, quatro professores detidos, sendo dois liberados apenas por volta das 5 da manhã do dia seguinte.
Também danos provocados pelos PMs ao forçarem a entrada, arrebentando cadeados e portas e empurrando as pessoas sobre os móveis da sala da plenária. Tudo isso debitado na conta dos profissionais de educação, pois, como todos sabem, vândalos usam como armas caneta pilot/giz, apagador e celulares.
Alguém até poderia dizer que foram poucas as vítimas sem nenhuma fatal…
Sim, é verdade. E teve alguém que se animou a defender essa perspectiva da ação policial: o comandante da PM!
Ele afirmou muito entusiasticamente que não houve nenhuma truculência, nenhum excesso, nem spray de pimenta nem nada, somente lá fora, um pouquinho, o necessário para dissipar…
Fotos publicadas no G1 desmentem isso e, inclusive, revelam o despreparo dos próprios policiais no manuseio desses artefatos. Vê-se claramente em uma das fotos que eles acabam jogando spray de pimenta nos próprios colegas, fogo-amigo entre policiais…
Quem não se lembra dos flagrantes de crianças de colo e até cachorros, recebendo spray, publicados nos jornais do Rio?
Toda essa ação foi transmitida ao vivo pela internet por valentes jovens integrantes da MídiaNinja, SEPE e professores que assumiram a tarefa de documentar a greve desde o seu início.
Um deles transmitiu diretamente de dentro da Câmara todo o corrido, ficando, assim, difícil sustentar as inverdades proferidas pelas “autoridades” e repercutidas pela grande imprensa como a de que profissionais da educação explodiram um coquetel molotov dentro da Câmara.
Pelas imagens víamos senhoras e senhores sentados na plenária quando houve a invasão da tropa de choque aos gritos.
Até mesmo os vereadores Reimont Otoni e Jefferson Moura foram agredidos por estarem ali e se recusarem a sair da frente, tentando proteger os/as educadores.
Integrantes do Black Bloc que acompanhavam pela internet, como eu, se solidarizaram e avisavam que já estavam correndo para o centro da cidade para ajudar os profissionais da educação.
Segundo relatos, esses jovens vieram portando uma arma terrível: leite de magnésia para aliviar os efeitos do spray de pimenta. Relembrando, em junho, várias pessoas foram presas, inclusive jornalistas, porque portavam vinagre consigo.
Como todos sabemos vinagre é uma arma de alta periculosidade, já taser e bala de borracha, não.
Relato de professor na comunidade Servidores Municipais do RJ:
“O menino que nos socorreu, de idade entre 14 e 16 anos,magro, franzino, mirrado, pequeno, mas de espírito forte e solidário (tenho mais respeito a ele com quem convivi minutos do que a muitos a quem conheço por tanto tempo…conheço???) foi até a delegacia… e nos acompanhou… o que mais a dizer… sem palavras. Só choro e compartilho, sem forças, mas vou me recuperar e a luta continua!!!”
Algo, contudo, chama muito a atenção. Antes da entrada violenta do choque, um dos policiais a porta da plenária da Câmara comunica aos profissionais ali dentro que a força policial estava ali por solicitação para remover todas as pessoas não autorizadas que ocupavam o edifício.Enquanto, diretores do SEPE ali presentes perguntavam ao policial onde estava a autorização judicial para a remoção, outros policiais ou sei lá o quê, fotografavam de modo bem arrogante as pessoas lá dentro, como se isso fosse necessário já que havia transmissão ao vivo 24 horas praticamente.
Falou-se numa autorização judicial expedida para aquele fim, mas não havia nenhum papel ou oficial de justiça para entregá-lo. Insistindo para que o mandado fosse apresentado, o policial por fim admitiu que não havia nenhum, pois, se tratava de ação “meramente” administrativa a pedido do governador e do presidente da Câmara.
Com a resistência dos ocupantes o choque entrou. Há documentação em imagem e som sobre o ocorrido além das transmissões que também ficam disponíveis. Os ocupantes resistiram até o fim.
A situação limite foi gerada pela prepotência do prefeito Eduardo Paes, o chefe da Casa Civil, Pedro Paulo, e a Secretária da Educação, Cláudia Costin. Durante mais de quatro anos o prefeito e a Secretária de Educação se recusaram a receber os profissionais da educação em audiência.
Cláudia Costin e Eduardo Paes mostram-se na imprensa como vítimas de uma manipulação política da oposição via SEPE, o que revela um simplismo analítico incrível, não por ingenuidade, mas por arrogância mesmo.
Não se trata de uma greve qualquer.
Os/as profissionais de educação do município do Rio a deflagraram após inúmeras tentativas de diálogo, sempre negadas e várias paralisaações que vinham ocorrendo desde o ano passado e foram se intensificando no decorrer do primeiro semestre de 2013. A decisão coletiva pela greve foi uma espécie de grito de socorro para a sociedade, um grito de pare!
É fundamental sublinhar que a categoria não realizava uma greve na rede municipal desde 1979. Foram, portanto, 19 anos! Vou repetir D-E-Z-E-N-O-V-E anos sem greve.
Não se trata, portanto, de atitude irrefletida ou tomada ao calor das manifestações de junho, ainda que estas tenham calibrado a reflexão sobre a conjuntura política.
Na primeira passeata pós-deflagração da greve 15 mil profissionais, embaixo de chuva fina, seguiram em passeata do largo do Machado ao Palácio da Cidade onde Educardo Paes decretou que naquele dia específico não haveria expediente.
Na passeata seguinte, havia um pouco mais de 15 mil, que caminharam da Tijuca à Prefeitura. E parecia que com tanta gente nas ruas, aproximadamente 80% da categoria parada, a população apoiando com chuva de papel picado, luzes piscando, bandeiras do Brasil tremulando nas janelas, buzinas, aplausos e dedões apontados para cima em sinal de positivo as negociações andariam no sentido de retirar o trio Paes-Costin-Pedro Paulo da torre de marfim e fazê-los descer ao solo da realidade.
Depois de muitas idas e vindas, ameaças de corte de ponto, exoneração, pressão das diretoras das escolas, foi acertado entre todas as demais reivindicações que o plano seria elaborado em consulta à categoria através do SEPE, desde que a categoria retornasse às salas de aula, isso foi feito, a greve foi suspensa e retornou-se ao estado de greve.
O acordo foi rompido pela Prefeitura que, após uma reunião com os 30 vereadores que formam a base do governo na Câmara, protocolou um plano confuso, redundante, obscuro sem qualquer consulta prévia ao SEPE.
O plano é tão mal escrito que gerou tamanho desconforto e desconfiança de que era melhor ter continuado como antes que a categoria voltou à greve.
E, na Câmara, em aproximadamente 5 dias 29 emendas foram elaboradas, além de correções ao texto terem sido inseridas pela própria Prefeitura, acrescentando-se também uma planilha.
Tão confuso tudo que a Prefeitura publicou no Diário Oficial mais de 40 perguntas e respostas sobre o plano na tentativa de esclarecer as pessoas já que uma enxurrada de perguntas foi feita diretamente ao trio.
A história é mais longa e com lances da ordem do absurdo. E merece ser contada em outro artigo a partir da análise dos entraves mais sérios entre todos os eventos que desenbocaram no beco estreito das posições entrincheiradas:
*A meritocracia — Bandeira de campanha de Eduardo Paes, orgulho de Cláudia Costin como método de modernização da educação e nova panaceia defendida por economistas neoliberais. É duramente criticada por educadores e especialistas em educação por promover atitudes antiéticas e mascarar, no final das contas, o flagelo da aprovação automática e da falta de autonomia dos/as professores/as.
* O emprego do dinheiro do FUNDEB – Saia justíssima do Prefeito. A transparência no emprego do dinheiro do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação.
*E as condições de infraestrutra das escolas – De um lado, Eduardo Paes alardeia construção de novas escolas, creches e centro educacionais. De outro, o Tribunal de Contas do Município cobra que das mais de mil unidades de ensino aproximadamente 150 tem condições de uso, todas as demais deveriam ser fechadas. Falta água, as salas são quentes e lotadas, banheiros são horríveis, as crianças não têm chuveiros para o banho após a educação física, inúmeras escolas não possuem quadras esportivas. Em outras tantas o reboco está caindo, há infiltrações, os muros podem cair, árvores precisam ser podadas, a parte elétrica corre risco de incêndio e por aí vai.
A greve não se concentrou em reivindicações salariais, mas nas injustas disparidades entre os diversos cargos, num plano de carreira unificado, ou seja, o documento que regula a vida funcional de toda a categoria, em questões pedagógicas, na política de educação desenhada para atender a interesses não necessariamente do desenvolvimento humano e social da população a qual se destina, nas péssimas condições de ensino seja infraestrutura ou na relação com as demais instâncias da Secretaria de Educação.
É um pacote muito mais amplo, por isso acenar com ajuste salarial de imediato não teve o resultado esperado de retorno às aulas.
Mas, a meu ver, algo é certo, Paes não teria se dado o trabalho de voar até a Prefeitura para fazer uma reunião com o SEPE, se não tivesse vislumbrado alguma rachadura nas estruturas de sustentação de seu edifício político.
Embora vaidoso como é, na primeira oportunidade e percebendo-se maior do que a situação resolveu que era hora de esticar a corda pensando que essa romperia no lado supostamente mais fraco (professores e oposição)
Bancários em greve se solidarizaram, até vereadores da base governista se manifestaram contra a remoção. Se as 40 perguntas e respostas foram como gasolina na fogueira, as manobras no regimento interno mais a remoção seguida de uma agradecimento público à PM na primeira página do site da Câmara serão o quê?
A segunda-feira, 30/09, desperta com uma lista interminável de atos por várias partes da cidade contra a violência gratuitamente endereçada a uma categoria profissional que vem organizando protestos pacíficos desde agosto.
Nesse último dia de setembro esperamos mobilizar um grande número de profissionais, mas sobretudo cidadãos e cidadãs que não permitem que a desfaçatez e a força bruta sejam colocadas em primeiro plano pelas instituições e representantes do Estado. E eu estou retornando ao Rio o mais rápido que eu puder, vou juntar a pleno pulmão, leite de magnésia e vinagre.
A tinta vermelha espero ter que usar somente para escrever os nomes daqueles que no sossego de seus lares dormiam tranquilamente o sono da certeza de que estão sobre a carne seca.
A sra. Claudia Costin, após vários dias sem o seu costumeiro hábito de utilizar o Twitter, escreveu muito alegremente, na manhã de ontem um “Bom domingo a todos!”
Para a senhora o que dizer além de que com isso ganhou o direito ao troféu desfaçatez do ano.
Em tempo: os profissionais da educação estudam as medidas judiciais cabíveis sobre a ação de resultou nas prisões e em feridos.
(*) Magaly Pazello é pesquisadora do InStituto Nupef:www.nupef.org.br.
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