"Me ofereceram dinheiro para assumir a culpa pela morte de JK", conta motorista
Em audiência na Câmara Municipal de São Paulo, Josias Nunes de Oliveira negou ter batido em Opala que levava ex-presidente pela Dutra no momento de sua morte
Marsílea Gombata Marsílea Gombata
Envolta em mistérios e objeto de investigação da Comissão Nacional da Verdade e da Comissão da Verdade “Vladimir Herzog”, da Câmara Municipal de São Paulo, o imbróglio da morte do ex-presidente Juscelino Kubitscheck ganhou um novo capítulo nesta terça-feira 1º.
Em depoimento da Comissão “Vladimir Herzog”, Josias Nunes de Oliveira, motorista do ônibus que supostamente teria batido no carro do ex-presidente, contou que lhe ofereceram uma mala de dinheiro para assumir a culpa pelo acidente. “Disseram que se eu pegasse o dinheiro e dissesse que sou culpado, o dinheiro era todo meu”, contou o aposentado de 69 anos. “Eles mostraram o dinheiro dentro da mala, eram notas antigas que o Juscelino mandou fazer de 500 cruzeiros. Não aceitei. Saíram do portão da minha casa e não voltaram mais.”
Segundo Oliveira, os dois homens se apresentaram como repórteres e apareceram à sua casa cinco dias depois da morte do ex-presidente, em 27 de agosto de 1976. “Ser acusado de ter provocado a morte de Juscelino mudou muito a minha vida. Até hoje”, disse antes de lembrar ter comentado sobre a mala de dinheiro durante as audiências sobre a morte de JK.
De acordo com a versão oficial, Juscelino morreu na Rodovia Presidente Dutra, na altura de Resende, quando vinha do Rio em direção a São Paulo e o carro no qual viajava teria batido em um ônibus da Viação Cometa, depois de o motorista Geraldo Ribeiro ter perdido o controle. Oliveira, no entanto, contesta e nega ter batido no carro. O ônibus que dirigia, segundo ele, ultrapassou pela esquerda o Opala do ex-presidente a cerca de 80 km/h, quando o veículo vinha a 70 km/h. Em seguida, o carro ultrapassou o ônibus pela direita, perdeu controle, atravessou o canteiro central, cruzando a pista e indo parar do outro lado.
“Eu parei para socorrer. Não parei de curioso para ver o que estava acontecendo. Parei porque senti a dor do acidente”, disse Oliveira. “Parei sem saber quem estava no Opala. O motorista morreu instantaneamente. Do Juscelino ainda vi dois piscares de olho.”
À época, o ex-presidente tinha 73 anos. Dois anos antes havia recuperado os direitos políticos cassados com a chegada da ditadura, em 1964. O ex-presidente sabia que tinha grandes chances de se reeleger e dar curso à trajetória que daria fim ao regime militar no Brasil. Uma vantagem que era motivo de preocupação dos agentes da Operação Condor, aliança político-militar entre as ditaduras do Brasil, Argentina, Chile, Bolívia, Paraguai e Uruguai. Em carta enviada no dia 28 de agosto de 1975 para João Baptista Figueiredo, o chefe do serviço de inteligência de Augusto Pinochet, o coronel Manuel Contreras Sepulveda, se dizia preocupado com a possível vitória do democrata Jimmy Carter nos Estados Unidos e o apoio a políticos de oposição ao regime militar na região, como o chileno Orlando Letelier e o próprio JK, que poderiam “influenciar seriamente a estabilidade do Cone Sul”. No ano seguinte, JK morria em agosto e Letelier, em setembro.
Detalhes. Na sessão, ainda, o presidente da comissão, o vereador Gilberto Natalini (PV), leu uma reportagem da época na revista Cruzeiro, que dizia: “o laudo pericial da polícia do Rio de Janeiro registra que a análise da tinta produziu a prova técnica, segura, definitiva e incontrastável de que o ônibus Cometa estava envolvido no acidente. O laudo foi assinado pelo perito Sergio de Souza Leite”, que teria sido afastado do cargo posteriormente. O vereador disse, no entanto, que o exame sobre a tinta da lataria do Opala no ônibus – peça fundamental para corroborar a tese de batida - foi anexado aos autos sem assinatura do analista chefe.
“Temos também um relato, que tiramos da revista Interview, de 1996, na qual o repórter Valério Meinel escreveu: ‘No dia seguinte à morte de JK o chefe de produção do Estadão, Raul Bastos, pediu para que esperasse na sucursal do Rio, a chegada do subchefe de produção Vanderlei Ribeiro, que saía de São Paulo para levar uma informação, já que os telefones do jornal estavam grampeados. A informação é que os repórteres do Estadão ‘cobrindo o acidente’ receberam a informação de guardas da Polícia Rodoviária Federal de que Geraldo Ribeiro [o motorista de JK] levara um tiro na cabeça disparado de uma Caravan emparelhada com o carro do presidente JK, atrás do ônibus, antes de ele passar’”, afirmou Natalini. “Descobrimos que um dos jornalistas está vivo e vamos atrás dele.”
Dentre outros detalhes não explicados em torno da morte do ex-presidente, lembrou o vereador, há também a perícia feita 20 anos depois em um veículo diferente do qual estava JK.
Em 13 de agosto, a comissão ouviu quatro depoimentos relacionados à morte de JK: Serafim Jardim, ex-secretário particular de Juscelino, Paulo Castelo Branco, que pediu a reabertura do caso em 1996, Paulo Oliver, um dos 33 passageiros do ônibus da viação Cometa, e Gabriel Junqueira Villa-Forte, filho do proprietário do hotel pelo qual o ex-presidente passou antes do acidente. O dono do hotel, o brigadeiro Newton Junqueira Villa-Forte, era próximo do general Golbery Couto e Silva e foi também professor de João Baptista Figueiredo.
Depois da sessão de agosto, a Comissão Municipal solicitou ao governador de Minas Gerais, Antonio Anastasia, nova perícia do fragmento metálico de sete milímetros encontrado no crânio do motorista de JK, assim como do crânio que apresentava uma furo. Na semana passada, o governo mineiro concordou com novas análises técnicas. A comissão tenta, agora, viabilizá-las judicialmente.
“O mundo inteiro apontava para mim na rua: ‘Foi aquele quem matou o Juscelino’. Eu tenho de provar que não fui eu”, disse Oliveira, que passou por dois processos sobre a morte de JK, mas acabou absolvido em agosto de 1977. “É muito estranha a entrada dele na pista... Esse acidente precisa ser mais investigado.”
Em depoimento da Comissão “Vladimir Herzog”, Josias Nunes de Oliveira, motorista do ônibus que supostamente teria batido no carro do ex-presidente, contou que lhe ofereceram uma mala de dinheiro para assumir a culpa pelo acidente. “Disseram que se eu pegasse o dinheiro e dissesse que sou culpado, o dinheiro era todo meu”, contou o aposentado de 69 anos. “Eles mostraram o dinheiro dentro da mala, eram notas antigas que o Juscelino mandou fazer de 500 cruzeiros. Não aceitei. Saíram do portão da minha casa e não voltaram mais.”
Segundo Oliveira, os dois homens se apresentaram como repórteres e apareceram à sua casa cinco dias depois da morte do ex-presidente, em 27 de agosto de 1976. “Ser acusado de ter provocado a morte de Juscelino mudou muito a minha vida. Até hoje”, disse antes de lembrar ter comentado sobre a mala de dinheiro durante as audiências sobre a morte de JK.
De acordo com a versão oficial, Juscelino morreu na Rodovia Presidente Dutra, na altura de Resende, quando vinha do Rio em direção a São Paulo e o carro no qual viajava teria batido em um ônibus da Viação Cometa, depois de o motorista Geraldo Ribeiro ter perdido o controle. Oliveira, no entanto, contesta e nega ter batido no carro. O ônibus que dirigia, segundo ele, ultrapassou pela esquerda o Opala do ex-presidente a cerca de 80 km/h, quando o veículo vinha a 70 km/h. Em seguida, o carro ultrapassou o ônibus pela direita, perdeu controle, atravessou o canteiro central, cruzando a pista e indo parar do outro lado.
“Eu parei para socorrer. Não parei de curioso para ver o que estava acontecendo. Parei porque senti a dor do acidente”, disse Oliveira. “Parei sem saber quem estava no Opala. O motorista morreu instantaneamente. Do Juscelino ainda vi dois piscares de olho.”
À época, o ex-presidente tinha 73 anos. Dois anos antes havia recuperado os direitos políticos cassados com a chegada da ditadura, em 1964. O ex-presidente sabia que tinha grandes chances de se reeleger e dar curso à trajetória que daria fim ao regime militar no Brasil. Uma vantagem que era motivo de preocupação dos agentes da Operação Condor, aliança político-militar entre as ditaduras do Brasil, Argentina, Chile, Bolívia, Paraguai e Uruguai. Em carta enviada no dia 28 de agosto de 1975 para João Baptista Figueiredo, o chefe do serviço de inteligência de Augusto Pinochet, o coronel Manuel Contreras Sepulveda, se dizia preocupado com a possível vitória do democrata Jimmy Carter nos Estados Unidos e o apoio a políticos de oposição ao regime militar na região, como o chileno Orlando Letelier e o próprio JK, que poderiam “influenciar seriamente a estabilidade do Cone Sul”. No ano seguinte, JK morria em agosto e Letelier, em setembro.
Detalhes. Na sessão, ainda, o presidente da comissão, o vereador Gilberto Natalini (PV), leu uma reportagem da época na revista Cruzeiro, que dizia: “o laudo pericial da polícia do Rio de Janeiro registra que a análise da tinta produziu a prova técnica, segura, definitiva e incontrastável de que o ônibus Cometa estava envolvido no acidente. O laudo foi assinado pelo perito Sergio de Souza Leite”, que teria sido afastado do cargo posteriormente. O vereador disse, no entanto, que o exame sobre a tinta da lataria do Opala no ônibus – peça fundamental para corroborar a tese de batida - foi anexado aos autos sem assinatura do analista chefe.
“Temos também um relato, que tiramos da revista Interview, de 1996, na qual o repórter Valério Meinel escreveu: ‘No dia seguinte à morte de JK o chefe de produção do Estadão, Raul Bastos, pediu para que esperasse na sucursal do Rio, a chegada do subchefe de produção Vanderlei Ribeiro, que saía de São Paulo para levar uma informação, já que os telefones do jornal estavam grampeados. A informação é que os repórteres do Estadão ‘cobrindo o acidente’ receberam a informação de guardas da Polícia Rodoviária Federal de que Geraldo Ribeiro [o motorista de JK] levara um tiro na cabeça disparado de uma Caravan emparelhada com o carro do presidente JK, atrás do ônibus, antes de ele passar’”, afirmou Natalini. “Descobrimos que um dos jornalistas está vivo e vamos atrás dele.”
Dentre outros detalhes não explicados em torno da morte do ex-presidente, lembrou o vereador, há também a perícia feita 20 anos depois em um veículo diferente do qual estava JK.
Em 13 de agosto, a comissão ouviu quatro depoimentos relacionados à morte de JK: Serafim Jardim, ex-secretário particular de Juscelino, Paulo Castelo Branco, que pediu a reabertura do caso em 1996, Paulo Oliver, um dos 33 passageiros do ônibus da viação Cometa, e Gabriel Junqueira Villa-Forte, filho do proprietário do hotel pelo qual o ex-presidente passou antes do acidente. O dono do hotel, o brigadeiro Newton Junqueira Villa-Forte, era próximo do general Golbery Couto e Silva e foi também professor de João Baptista Figueiredo.
Depois da sessão de agosto, a Comissão Municipal solicitou ao governador de Minas Gerais, Antonio Anastasia, nova perícia do fragmento metálico de sete milímetros encontrado no crânio do motorista de JK, assim como do crânio que apresentava uma furo. Na semana passada, o governo mineiro concordou com novas análises técnicas. A comissão tenta, agora, viabilizá-las judicialmente.
“O mundo inteiro apontava para mim na rua: ‘Foi aquele quem matou o Juscelino’. Eu tenho de provar que não fui eu”, disse Oliveira, que passou por dois processos sobre a morte de JK, mas acabou absolvido em agosto de 1977. “É muito estranha a entrada dele na pista... Esse acidente precisa ser mais investigado.”
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