Haddad ensina como o PT deve travar a guerra da comunicação
Neste momento em que governos petistas de todo o país, em todos os níveis (federal, estadual e municipal), mergulham na impopularidade por razões justificáveis (campanha de oposição da mídia e crise econômica) e injustificáveis (por inação e medo do enfrentamento político), o prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, deu uma aula de comunicação eficiente.
Ao fim deste texto, o internauta poderá ouvir na íntegra, em três partes, a entrevista de Haddad, que mostra luz no fim do túnel para o PT. Antes, algumas pertinentes considerações.
Na quarta-feira da semana passada (12), o prefeito compareceu ao “Jornal da Manhã”, tradicional programa da Rádio Jovem Pan, em rede nacional. Para sabatiná-lo, dois empedernidos antipetistas de carteirinha: o historiador(explicitamente) tucano Marco Antônio Villa e a âncora do telejornal do SBT, Raquel Sheherazade.
Foi um massacre. A disparidade de preparo intelectual entre os entrevistadores e o entrevistado ficou escandalosamente evidente. Villa, o que mais apanhou, apesar de Haddad tratá-lo com urbanidade. Apenas mostrou quão desinformado sobre os assuntos ao debater com um administrador ciente, nos mais sutis detalhes, da estrutura administrativa na (super)prefeitura paulistana que comanda.
Sheherazade, aparentemente intimidada, decidiu pegar leve. Villa, porém, apesar de agressivo, não teve alternativa senão apelar à ironia, como forma de compensar sua falta de informação e argumentos para eventuais contraditórios.
Nos primeiros minutos da longa entrevista – de quase uma hora e meia –, o prefeito já dera um “chega-pra-lá” em Villa, sinalizando que não iria ter moleza. Confira, abaixo, o primeiro ataque do historiador tucano e a forma como Haddad repeliu a ofensiva.
Marco Antonio Villa – O senhor já percorreu mais da metade do mandato. A última avaliação Datafolha do senhor não foi positiva. Quando é uma avaliação no primeiro mês, no primeiro semestre, no primeiro ano, sempre há uma justificativa do mandato anterior; historicamente é no Brasil assim. Mas o senhor já cumpriu mais da metade do mandato e a avaliação ruim e péssimo é extremamente alta para os padrões inclusive de São Paulo, onde os prefeitos inclusive também foram mal avaliados; é de 44%. Como é que o senhor avalia? Quem é que está errado, a gestão do senhor ou os eleitores.
Fernando Haddad – Acho que você…
Marco Antonio Villa – É? Os dados estão errados?!
Fernando Haddad – Não, você. Vila, você é historiador…
Marco Antonio Villa – Sim…
Fernando Haddad – …Então você tem que fazer análise de série histórica…
Marco Antonio Villa – Sim…
Fernando Haddad – …Se fosse pegar o primeiro semestre do terceiro ano da gestão da Marta e do Kassab, vai ter, exatamente, a mesma avaliação…
Marco Antonio Villa – Sei, sei… Eu precisava consultor esses dados… Então o senhor acha normal ter 44% de ruim e péssimo depois de dois anos de gestão?
Fernando Haddad – Dependendo da conjuntura, sim.
Marco Antonio Villa – E que conjuntura que o senhor tem que o senhor pode explicar que a gestão… Que os eleitores estão errados, que eu estou errado, que o senhor está certo?
Fernando Haddad – Não, eu não estou dizendo que os eleitores estão errados…
Marco Antonio Villa – Sei…
Fernando Haddad – Estou dizendo que a sua análise está errada. Você falou que é a primeira vez que isso acontece e eu estou dizendo que não…
Marco Antonio Villa – Sim…
Fernando Haddad – Estou dizendo que na gestão da Marta aconteceu, na gestão do Kassab, antes da reeleição, aconteceu e, portanto, não é uma novidade em São Paulo…
Marco Antonio Villa – E por que que isso acontece?
Fernando Haddad – Olha, tem várias razões. Por exemplo, tarifa de ônibus. É uma coisa que afeta muito a popularidade no Brasil, mas, em São Paulo, em particular…
Marco Antonio Villa – Sim…
Fernando Haddad – Se você pegar os quatro anos de mandato da gestão da Marta e os quatro anos de mandato da gestão Kassab – o segundo mandato, porque o primeiro não houve reajuste e, no segundo, um reajuste muito acima da inflação – você vai ver que as pesquisas que foram feitas na sequência dos reajustes de tarifa, deram indicadores [negativos] superiores a esse que você acabou de se referir…
Raquel Sheherazade – Prefeito Haddad…
Fernando Haddad – … Em março de 2003, a Marta estava no terceiro ano de mandato, como eu. Teve 45% de ruim e péssimo. Imediatamente depois do reajuste da tarifa. Se você pegar os dois reajustes do Kassab no segundo mandato, chegou a 46% de ruim e péssimo. Basta você [Villa] pegar a série história – você é historiador, sabe fazer leitura de números – e vai ver que a coisa é bem diferente […]
Ufa! Haddad correu o risco de ser acusado de espancamento com requintes de crueldade. O prefeito provou que o “historiador”, na vã tentativa de fustigá-lo, não conhece nem a história recentíssima de sua cidade. Não teve nem o cuidado de ir ao site do Datafolha analisar como estava a popularidade dos antecessores de Haddad quando chegaram a terceiro ano de mandato nos primeiros meses do ano – quando a tarifa do transporte público aumenta em todo o país.
Ao longo da entrevista, Haddad explicitou um outro dado: é extremamente fácil rebater as críticas da mídia tucana. Só é necessário alguém com boa oratória e informado sobre dados políticos e técnicos da administração, cujo domínio ele comprovou. Tais prerrogativas, aliadas a uma retórica fluente e concisa, triturou os pândegos e despreparados apresentadores da Rádio Jovem Pan.
Mais adiante, aliás, diante de um entrevistado com as rédeas do debate, o “Jornal da Manhã” pôs no ar um ouvinte mal-educado com uma crítica ridícula ao prefeito, cujo tema coincidentemente já fora abordado. Vale a pena conferir, abaixo:
Ouvinte – Bom dia, pessoal da Jovem Pan[não cumprimentou Haddad]. Meu nome é [inaudível]. Eu sou de Carapicuíba. Em resposta a esse “prefeito Haddad”, o que define o mandato dele como péssimo são as ruas esburacadas, é esse preço do ônibus, a tarifa do ônibus, essa saúde de São Paulo, é isso que define esse governo dele como péssimo. Esses números…
Fernando Haddad – É, você vê que a tarifa de ônibus fica na cabeça das pessoas. O que as pessoas não entendem é que o salário do motorista e do cobrador aumenta. Nos últimos quatro anos a tarifa ficou congelada […]. O último reajuste foi quatro anos atrás. O salário de motorista e cobrador aumentou 35%, nos últimos quatro anos; o reajuste da tarifa foi 17%. E ele [o ouvinte], você vê que ele não menciona o metrô. Ele poderia estar se referindo, também, ao metrô e ao trem. Ele não menciona. Provavelmente porque ele desconhece que é atribuição de outra esfera de governo… São dois governos de dois partidos diferentes que tomaram a mesma medida, não contra a população, mas porque há custos aumentando […]
A entrevista foi longa – cerca de oitenta minutos, que o leitor poderá ouvir ao fim do texto –, mas os trechos que você leu acima sintetizam o que nela ocorreu. Haddad arrasou entrevistadores despreparados(mal intencionados) e ouvintes desinformados. Seguramente, pessoas de melhor nível intelectual entenderam e aprovaram os esclarecimentos do prefeito.
O que não se entende é por que um governante tão evidentemente sério, tão bem articulado, capaz de, inclusive, expor entrevistadores mal-intencionados ao ridículo só começou a falar, a travar o debate político de forma adequada, no terceiro ano de mandato.
Esse formato de entrevista favorece demais o prefeito. Ele tem que conseguir mais desses espaços – e, para o prefeito da maior cidade brasileira, não será difícil.
Futuramente, claro, a mídia antipetista tentará escalar adversários[não havia entrevistadores nessa entrevista da Jovem Pan, mas adversários] melhor preparados do que os sofríveis Marco Antonio Villa e Raquel Sheherazade. Mas isso talvez até facilite as coisas para um administrador que fala com clareza e conhecimento de causa.
Seja como for, Haddad ainda tem quase dois anos de mandato pela frente. Acaso se disponha a enfrentar o debate democrático, sobretudo nessas rádios que tanto fazem a cabeça dos paulistanos e que se dirigem a um público praticamente indefeso diante das manipulações tucano-midiáticas, fará a população entender melhor sua excelente gestão.
Não há que nos debruçarmos muito sobre o conteúdo da entrevista, pois o prefeito da capital paulista fala de problemas que, para a grande maioria dos leitores desta página, de outros estados, não dizem respeito. Mas é imperioso ressaltar, além da desenvoltura verbal, o potencial político de alguém na função de tanta relevância.
Há poucos políticos tão preparados quanto Haddad, no país. E quando se alude a preparo, não é só o administrativo, mas o que evidencia sua faceta de exímio comunicador. Um quadro disponível para voos bem mais altos nas perspectivas eleitorais do Partido dos Trabalhadores, em nível nacional.
Confira, abaixo, a entrevista de Haddad à Jovem Pan, Em três partes.
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