Quem escolhe como seremos
vistos pelo mundo e o que está
sendo mostrado do Brasil lá fora
Um jornalista estrangeiro, correspondente de uma agência de notícias aqui no Brasil, assinou um artigo como Lawrence Charles no RioOnWatch.org. (É possível que se trate de um pseudônimo.) Sua reflexão sobre como as notícias são vendidas e compradas, encomendadas e publicadas, em seu trabalho de cobrir o Brasil e a Copa, joga muita luz sobre o funcionamento da mídia, inclusive a internacional. Seu artigo, The World Cup of Lazy Journalism , ou “A Copa do Mundo do Jornalismo Preguiçoso”, expõe as diferenças entre o que ele está enxergando aqui no front e o que está sendo demandado para publicação por seus editores – e que resulta no material efetivamente veiculado lá fora, em escala global.
Escreve ele: “Quando eu respondi a meus editores que nada de relevante estava sendo incendiado [o pedido de pauta era uma busca por ‘ônibus incendiados’, por conta de uma greve dos motoristas], mas que eu poderia produzir perfis detalhados dos motoristas em greve, parei de receber e-mails. Se não tem carnificina, não tem matéria.
“Como eu só sou pago se alguém compra a pauta que proponho, pensei em escrever de volta para a agência vendendo termos como ‘violência na favela’ ou ‘polícia disparou/matou’”. A verdade é que há coisas terríveis acontecendo em algumas das centenas de favelas no Rio e houve protestos necessários e há a ameaça de muitos mais. Mas, ao lado disso, há também muitas, várias histórias que podem e devem ser contadas. Por exemplo, a favela Asa Branca é o lugar mais feliz que eu encontrei no Rio – e três décadas de notável avanço arquitetônico estão agora sendo ameaçadas pela expansão imobiliárias. (…) E na favela da Maré, onde houve uma ocupação recente, há comunidades inspiradas organizando debates importantes sobre segurança pública.”
São matérias que pouco saem por aqui. E que pouco saem lá fora também, infelizmente.
(Em tempo: o RioOnWach.org é um veículo criado em 2010 pela Catalytic Communities, CatComm, uma organização americana sem fins lucrativos e presente no Rio na forma de uma ONG. A sigla Rio On Watch se traduz em Rio Olympics Neighborhood Watch e o programa busca fazer ecoar mundialmente as vozes das favelas cariocas no percurso de construção das Olimpíadas de 2016.)
O BRASIL CARECE DE UM BOM TRABALHO DE PR
Parte do que dizem de nós não está sob nosso controle. Mas é possível trabalhar a imagem do país no nível da influência e da reputação. Como fazem pessoas e marcas. O Brasil é uma marca. Que nós, os donos dela, temos tratado muito mal. Imagine o dono de um produto que vibra mais quando falam mal do seu produto do que quando falam bem dele. Esses somos nós.
Esta Copa já está representando uma inversão brutal das expectativas do mundo em relação ao país. E isso é muito alvissareiro. O influxo de dinheiro do turismo é o único objetivo de um país ao sediar um megaevento. Não só pensando nos turistas que vem para o evento, mas nos turistas que passam a considerar o país como um destino desejado depois do evento. Essa matéria do The Herald Sun, jornal australiano, é um bom exemplo do que a Copa pode fazer pelo Brasil em termos de visibilidade positiva: Beer, barbies and sport — Porto Alegre ensures Aussies feel right at home as Socceroos play…., ou “Cerveja, churrasco e esporte – Porto Alegre garante que os australianos se sintam em casa enquanto nosso jogadores entram em campo…” Aproximadamente 15 000 australianos invadiram Porto Alegre para o jogo contra a Holanda, nesta quarta feira. Nem eu mesmo saberia vender tão bem Porto Alegre. (Em especial, quando se referem ao Grêmio como o segundo maior time da cidade…)
É A ECONOMIA, ESTÚPIDO
O Los Angeles Times chama a atenção para o momentum da arquitetura brasileira: Beyond the World Cup stadiums, architecture in Brazil returns to glory, ou “Além dos estádios da Copa do Mundo, a arquitetura no Brasil retorna a sua glória”. Quanto vale isso sendo lido e gerando curiosidade na California, o estado mais rico do país que tem a maior economia do mundo? Às vezes faz falta pensarmos um pouco mais como empreendedores. Olhando um pouquinho mais para a economia e um pouquinho menos para a política.
A GENTE SE VENDE MAL
Além do maravilhoso projeto do exoesqueleto “Walk Again”, do Miguel Nicolelis, palmeirense roxo, que ainda vai ganhar um Nobel por isso (anote), e que acabou de ganhar uma capa da revista Nature, a bíblia dos cientistas, há outras duas enormes invenções brasileiras, que estamos vendendo muito mal, como nos soi, mas que podiam, por si só, nos guindar do viralatismo: (1) o o spray que marca o lugar das faltas e das barreiras no gramado. Uma solução simples e inteligente para o batedor não aproximar a bola do gol e também para a barreira não andar em direção a bola, tirando o ângulo do batedor. A gente usa isso desde 2000. Para o mundo, está nascendo agora. E (2) a placa eletrônica que os árbitros reservas levantam para orientar a substituição dos atletas.
CINCO MOMENTOS CINEMATOGRÁFICOS DA COPA
E nem estou me referindo a presença secreta e relâmpago de Hugh Jackman em Cuiabá para assistir ao jogo Chile vs Austrália, no último dia 12.
Falo de quatro momentos Tarantino e um Werner Herzog da Copa:
1. Turistas mexicanos reagem a assalto e dão um couro no meliante em Natal.
2. Otaviano Costa arremessa um coco em punguista na orla do Rio e evita assalto.
3. Pai tira filho Black Bloc pela orelha de uma manifestação em São Paulo e lhe dá uma bronca na frente dos amigos e das câmeras.
4. Dias antes da Copa, Gaviões da Fiel impedem manifestantes de chegar perto do Itaquerão para protestar. E ninguém encarou os manos.
E:
5. Ingleses vestidos de Cruzados socializam com manauares vestidos de índios sob um calor de 36 graus.
O JOGO DO BRASIL E A VOLTA DO TORCEDOR CANALHA
O viralatismo tem uma versão futebolística – o torcedor canalha, síntese cunhada por André Fontenelle num artigo clássico publicado na revista Placar, da Abril, em 2000. Esse tipo de torcedor apoia o time somente quando tudo vai bem. E parte rapidamente para as vaias assim que a primeira dificuldade se apresenta. Não é, ainda bem, o que se viu presencialmente no Castelão – a torcida cearense é tida com uma das melhores do país quando quem está em campo é a Seleção. Já nas redes sociais, basta um empate para ver gente pedindo a cabeça de Fred, de Oscar, de Paulinho. Talvez por ignorância sobre futebol e sobre competições. Talvez por canalhice pura e simples. Enfim, é como se estivéssemos sempre com a faca na mão, escondida às costas, só esperando a primeira oportunidade para usá-la.
É preciso separar bem o que é jogar mal do que enfrentar um adversário duro numa partida difícil. Tirante os primeiros 15 minutos do segundo tempo, em que não tocamos na bola, porque perdemos o meio campo com a saída de Ramires e não ganhamos a ofensividade esperada com a entrada de Bernard, o Brasil jogou bem. A zaga esteve perfeita. Julio Cesar se mostrou mais seguro, o que é importante. Dani Alves e Marcelo apoiaram melhor e marcaram muito melhor do que nas últimas partidas. E Neymar continua confiante, indo para cima, chamando o jogo. Além disso, Luis Gustavo continua com sua enorme regularidade. Ramires entrou bem e só saiu por uma opção tática. Paulinho está jogando abaixo, é fato. Oscar não brilhou mas desempenhou uma função tática importantíssima. Fred ficou isolado contra três zagueiros e quase não recebeu a bola. E Bernard não mostrou estatura. (Sem trocadilho.) Jogamos melhor do que contra a Croácia. Só que do outro lado teve um time muito aplicado e um goleiro que operou quatro milagres. Vamos com calma. Não esperemos goleada em todas as rodadas. Repito: o Brasil criou quatro chances claras de gol contra uma retranca muito bem azeitada, que provavelmente passará em segundo lugar e representará problemas para quem a enfrentar nas Oitavas.
Talvez não sejamos a melhor seleção da Copa. Mas não deixamos de sê-lo por conta desse empate contra o duro time mexicano. E nem passaremos a ser os maiorais se golearmos Camarões na semana que vem em Brasília.
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