Surpresa! O grupo dos BRICS
não depende da Fifa...
Eduardo R. Gomes (*)
O Brasil perdeu a Copa, mas já no que diz respeito à reunião do grupo dos Brics (realizada em Fortaleza, de 14 a 16 de julho) não... Nesse caso, a conversa é muito diferente daquela em que grande parte da imprensa se debruçou: “O Brasil perdeu...”, “O Brasil teve que ceder...”,”O Brasil tenta emplacar o presidente do banco...”. Nada disso: avaliações em termos de perde/ganha na política são, no mínimo, inócuas particularmente no âmbito internacional. Política não pode ser vista pelas lentes do futebol, mas parece ser essa a única forma que grande parte da “grande” imprensa brasileira e seus “analistas de plantão” sabem dar às intrincadas questões internacionais, aliás, assim como fazem nas nacionais.
Basta lembrar um exemplo de história do ensino médio, para o que os jornais e supostos “debates” de TV desses dias sabre a reunião do BRICS nos “informam”. Vejamos: o Japão perdeu a Segunda Guerra Mundial? Pode-se facilmente dizer que perdeu, atingido que foi por duas bombas atômicas, mas, olhando com mais cuidado o cenário muda de figura: derrotado no conflito bélico, tornou-se uma das maiores potências mundiais, apesar de ter sido ocupado pelos Estados Unidos, no intuito de desarmá-lo e reconstruí-lo segundo o american way of life. O Japão foi desarmado até a última bala, mas jamais abraçou o fundamentalismo de mercado americano, criando uma economia pujante, inovadora, através de um cuidadoso planejamento governamental, entre outras conquistas.
Aqui e agora, ao invés de explorar as implicações complexas e certamente controversas da criação do Novo Banco de Desenvolvimento e do Acordo Contingente de Reserva do grupo dos Brics, o debate jornalístico e televisivo no Brasil não explora a complexidade desses fatos, desconsiderando, como mostramos, que uma vitória pode se transformar em uma derrota e uma derrota em vitória. Parecem não entender que política não é o que chamamos de um jogo de perde/ganha, como é o caso do noticiário da reunião do Brics, exemplificado no início deste artigo. Política é negociação, mas o noticiário parte de um diagnóstico primário, em geral, decidido ex-ante e repetindo-o à exaustão. Acho os editores nem repararam que muitos que antes eram crédulos neste tipo de já estão ficando céticos.
Acordos de cooperação
Pior: os soi-disant jornalistas tendem a retratar cada gesto das autoridades de maneira claramente instrumentalizada para determinados fins, estes muitas vezes construídos pelos próprios articulistas, e que não vemos assumidos por ninguém, demonstrados por fatos – eles especulam sem a menor parcimônia e, duplamente pior, sem explicitar que estão especulando, como no caso das relações do Novo Banco de Desenvolvimento e o FMI. Apesar de buscar “óbvias”, “previsíveis” manifestações de conflitos entre essas agências, diriam, tiveram que engolir gestos de alto nível de cordialidade entre ambos os lados.
Enfim, o fato é que Brasil, Federação Russa, Índia, China e África do Sul formalizaram não só o banco de desenvolvimento e a ACR, mas uma série de outros acordos de cooperação, cujo potencial – e limitações – para se desenvolverem mais e mais rapidamente foi pouco e mal abordado pela nossa imprensa, que transmitia uma suspeição se tal iniciativa era “para valer”, ou se “estava à nossa altura”... o que, para mentes abertas, não é pouco em um mundo passando por uma longa crise, de rumos incertos. Ainda bem que temos uma imprensa livre... em outros países do mundo.
(*) Eduardo R. Gomes é cientista político.
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