O ovo da serpente
fascista pode sair
pela culatra
Kátia Gerab Baggio (*)
Vou arriscar uma aposta. Que os veículos direitistas da mídia — principalmente através de colunistas raivosos como Reinaldo Azevedo e “jornalistas” quase inacreditáveis como Rachel Sheherazade (ambos merecem aspas na palavra jornalista) —, além de vídeos que circulam na internet de figuras de extrema-direita como Olavo de Carvalho, estão chocando o ovo da serpente fascista, isso já sabemos. A enorme votação, em 2014, do deputado federal Jair Bolsonaro (PP-RJ) é apenas uma das provas desse avanço da extrema-direita truculenta e sem escrúpulos.
Entretanto, arrisco dizer que algumas atitudes desses extremistas de direita e/ou oportunistas podem ser tiros pela culatra.
As agressões mal-educadas aos ex-ministros Guido Mantega, em um hospital, e Alexandre Padilha, em um restaurante; o “bundalelê” de militantes da Força Sindical em plena Câmara dos Deputados; os ratos (ou hamsters, tanto faz) soltos durante a sessão da CPI da Petrobras na qual era ouvido o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto; xingamentos e agressões a ciclistas na cidade de São Paulo (colocando, inclusive, suas vidas em risco), como reação às “ciclovias vermelhas do prefeito petista Fernando Haddad”; as ofensas repetidas de Jair Bolsonaro a mulheres (parlamentares ou não) e homossexuais; as manifestações preconceituosas e agressivas de direitistas contra negros, mulheres (feministas ou não), gays, militantes de movimentos sociais e de direitos humanos, além de nordestinos, podem provocar o aumento da rejeição a essa direita, que, sem dúvida, cresce no país.
É claro que a internet e as redes sociais contribuem imensamente para a exacerbação de truculências e desrespeitos (e aqui incluo alguns setores das esquerdas, ainda que minoritários).
Não tenho dúvida de que essa direita truculenta sempre existiu no Brasil. A história de violência contra os movimentos sociais e de superexploração do trabalho demonstra isso.
Mas a direita e a extrema-direita “saíram do armário”, nos últimos anos, como reação aos mais de 12 anos de governos federais liderados pelo PT, com a conivência, ou mesmo o apoio e estímulo, da mídia liberal-conservadora, explicitamente antipetista.
Entretanto, os exageros dessa direita truculenta, fora e dentro do Congresso Nacional, estão demonstrando o quanto essas pessoas desprezam a democracia e desrespeitam quem pensa diferente delas.
Ou seja, avalio que há dois movimentos em relação às direitas: de um lado, seu avanço inequívoco. De outro, a crescente exposição pública de sua truculência e desrespeito pelas regras básicas do regime democrático e da convivência social respeitosa das diferenças, diversidade e pluralidade.
Os mais de 12 anos de governos liderados pelo PT e os importantes avanços sociais conquistados nesses anos (ainda muito limitados, na verdade, diante da dimensão das desigualdades no Brasil) estão revelando, cada vez mais, um país que estava submerso, caracterizado pelo ódio de classe e rejeição às conquistas sociais e aos direitos humanos.
Ao mesmo tempo, a truculência dessa gente está cada vez mais exposta. E isso pode gerar, possivelmente, uma crescente rejeição ao avanço dessa direita agressiva por parcelas da sociedade brasileira que podem até ser conservadoras, mas não admitem esse circo infame que tem sido protagonizado por alguns parlamentares, setores da mídia e da própria sociedade.
Como escrevi no início, é uma aposta de que nem todos os setores da sociedade brasileira que fazem oposição ou têm restrições ao PT, aos governos liderados por petistas e/ou às esquerdas apoiam agressões, truculência e circo midiático e parlamentar (com minhas desculpas aos artistas circenses, que nada têm a ver com isso).
(*) Kátia Gerab Baggio é professora de História das Américas na UFMG.
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