Manchetes sugerem arquivamento que não houve e omitem o “por enquanto” de Aécio Neves
Luiz Carlos Azenha
No dia 5 de março, a Folha usou um subterfúgio para colocar no mesmo patamar a presidenta Dilma Rousseff e o tucano Aécio Neves quanto à lista de Janot. Disse que Janot havia rejeitado inquéritos sobre ambos. Se assim foi, o diário conservador poderia ter acrescentado que o procurador-geral também rejeitou inquéritos sobre o Bob Esponja e o Ronald Mc’Donald.
Fato 1: Aécio Neves foi citado pelo doleiro Alberto Yousseff, em sua delação premiada, como beneficiário de um esquema envolvendo Furnas. Yousseff afirmou, com todas as letras, ter ido a Bauru pessoalmente receber dez pagamentos relacionados ao esquema. Mencionou a irmã de Aécio como suposta intermediária. Como argumentamos aqui, já existe um inquérito em andamento na Justiça sobre o esquema mencionado por Yousseff. Há, portanto, fatos a investigar neste caso. Com base nisso, os procuradores da Lava Jato pediram um inquérito que envolveria Aécio. Rodrigo Janot não os atendeu. Por enquanto, ele frisou, por enquanto.
É que as afirmativas de Alberto Youssef são muito vagas e, sobretudo, assentadas em circunstâncias de ter ouvido os supostos fatos por intermédio de terceiros (um deles, inclusive, já falecido: José Janene). Outro detalhe relevante: a referência de que existia uma suposta ‘divisão’ na diretoria de Furnas entre o PP e o PSDB – o que poderia ensejar a suposição de uma ilegítima repartição de valores entre as duas agremiações – não conta com nenhuma indicação, na presente investigação, de outro elemento que a corrobore. Dessarte, sem que se tire a credibilidade de todo o mais que foi dito – com elementos mais detalhados e seguros – pelo colaborador em relação aos demais pontos (daí a necessidade de análise individualizada de cada um dos fatos e dos supostos envolvidos), fato é que, no entender do Procurador-Geral da República, tal como realizado em detrimento a outros indicados nas delações que estão sob análise, não há como, neste momento, em face do que se tem concretamente nos autos, dar andamento a investigação formal em detrimento do parlamentar. De qualquer modo, nunca é demais se frisar que não se está fazendo nenhum juízo insuperável acerca da procedência ou não de eventual participação do parlamentar referido no suposto fato relacionado a Furnas. O que se impõe assentar é que, diante do que há de concreto nos autos até o presente, não há sustentação mínima para requerimento de formal investigação. É importante acentuar que tais conclusões prefaciais não inviabilizam que, caso surjam ulteriormente dados minimamente objetivos que justifiquem e permitam uma apuração em relação ao parlamentar, se retorne o procedimento próprio para tal fim.
Fato 2: Não houve a mesma coisa com Dilma. Não é possível arquivar algo que nem foi pedido. A manchete da Folhafoi no mínimo enganosa. Uma tentativa de equiparar situações distintas. “Ela não foi investigada primeiro porque não há fatos, não há indícios, não há nada a arquivar“(grifo nosso), afirmou hoje o ministro da Justiça José Eduardo Cardozo a respeito de Dilma.
Cardozo desmentiu a teoria, espalhada pelos jornalões, de que Dilma não teria sido investigada por conta do artigo 86 da Constituição. Ele diz:
§ 4º – O Presidente da República, na vigência de seu mandato, não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções.
[Clique aqui para ver a entrevista completa, indicação do Franco Atirador]
Fato 3: A Folha insistiu na mesma estratégia neste sábado. O nome de Dilma foi parar no manchetão. É verdade que Antonio Pallocci será investigado na condição de tesoureiro de campanha da presidente. Pallocci é mencionado pelo delator Paulo Roberto Costa, ex-diretor da Petrobras. Costa disse que teria recebido um pedido do doleiro Alberto Yousseff para liberar R$ 2 milhões para a campanha do PT. Ouvido, Yousseff negou a afirmação do outro delator “categoricamente”, na descrição feita esta tarde pelo ministro da Justiça.
Parênteses: Chamou atenção, na coletiva do ministro, o fato dele frisar que Pallocci “não tinha cargo no governo” em 2010. Seria uma vacina preventiva em relação a futuras revelações?
Voltando à Folha: por que mencionar Dilma e esconder o senador tucano Antonio Anastasia, cria e aliado de Aécio Neves? Em minha modesta opinião, pelo ineditismo, Anastasia também merecia figurar na manchete. “Tsunami do petrolão varre até tucano de alta plumagem”, escreveria o saudoso Notícias Populares. Não é inédito um senador da oposição tirar proveito de um esquema que, em tese, teria sido montado para beneficiar governistas?
Fato 4: A divulgação da lista de Janot demonstra que, como a blogosfera denunciou seguidamente nos últimos meses, os vazamentos foram seletivos. Procurei no Google alguma manchete a partir do vazamento da menção de delatores a Aécio Neves ou Antonio Anastasia. Não houve qualquer retorno. Zero. Nada remotamente parecido com isso aqui — que foi baseado numa estimativa para a qual o delator Pedro Barusco não apresentou, ainda, provas:
Fato 5: A capa da Veja que precedeu o segundo turno das eleições foi um macro factóide, a partir de um fiapo de informação. O doleiro Yousseff disse em depoimento que vários ministros, o ex-presidente Lula e a presidente Dilma sabiam dos desvios na Petrobras, mas nada acrescentou de factual.
Sobre isso, o procurador-geral Rodrigo Janot escreveu ao ministro Teori Zavascki, do STF: “A análise concreta desta referência, com outras em que disse também acreditar que determinadas pessoas sabiam dos fatos, não pode gerar automaticamente providência de investigação direta quanto a eles se não há nenhuma indicação sequer de um dado que permita esta conclusão”. O grifo é nosso. Ou seja, especulação, fofoca, boato. Opinião não sustentada em fatos.
A partir da qual, com um desenho que sugeria acesso aos subterrâneos da Lava Jato, a Veja preparou material de campanha:
A ironia perversa é que, quando esta capa da Veja foi utilizada na campanha eleitoral, o doleiro já tinha mencionado Aécio(AQUI), a irmã de Aécio, a empresa Bauruense e o esquema de Furnas. Menção que só agora, passada a eleição, veio à tona.
É ou não é pilantragem, a título de jornalismo?
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