sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Mensalão, um caso inacabado e sem esperança - 1ª parte                          

Há alguns dias, Luis Nassif viu na prisão dos condenados da AP 470 o fim de um ciclo, aqui no blog, um post se intitulava “Findo o mensalão, quem ganhou e quem perdeu?” e na imprensa que acompanhei, uma tentativa de passar a ideia “acabou”.
Pensei: não,  na verdade, está se iniciando uma nova etapa de um caso inacabado.
A ressaca do mensalão.
Quem a acompanhou o frenesi que tomou conta da imprensa quando da condenação dos réus deve ter estranhado a repercussão de suas prisões. Não vi o mesmo destaque, a mesma comemoração quase orgiástica das grandes conquistas esportivas nacionais. Para um fato muito mais dramático, as prisões, as manchetes eram até comedidas. Não acompanho noticiário de TV, mas o pouco que vi estava longe do que vimos anteriormente.
Claro, houve matérias tal quais as da Folha de São Paulo descrevendo como é a vida na prisão com destaque para as dimensões minúsculas das celas e para o fato de que nelas os banhos são frios. Destinavam-se a excitar aos tarados de sempre.
No mais, comedimento.
Pensei, por quê?
Ressaca.
Alguns senhores e duas senhoras de meia-idade embarcando em um avião da Policia Federal rumo a um presídio não simbolizava nada que pudesse representar a “lavagem da alma nacional”.
Aquelas imagens eram como os comensais retardatários de uma festa que já havia terminado.
Então o mensalão realmente havia acabado?
Não. O mensalão mudava de estágio.
Não há mais nada que se possa fazer contra os réus. Pelo menos nada que nosso estágio civilizatório aceite.
Começa agora outro ciclo que levará a revisão desse mesmo processo onde todos os exageros foram permitidos à acusação. Daí a ressaca.
O que veremos.
Os prisioneiros – enquanto eles estiverem presos, o mensalão não acaba. E as penas são longas para os réus sem mandato parlamentar.
O sistema penitenciário tem uma batata quente na mão. Voltou a ter prisioneiros políticos. Por que é assim que serão vistos – é inescapável.
Sua integridade física passa a ser a preocupação número 1 dos administradores prisionais. Uma coisa é bater no peito e bradar que todos são iguais perante a lei e que os rigores devem ser o mesmo para ricos e pobres e outras demagogias. Demagogia porque submeter um “rico” ao mesmo tratamento desumano dado a um “pobre” não melhora em nada a condição do “pobre”, mas dá destaque a desumanidade. Outra coisa é ter um pequeno grupo de prisioneiros especiais e ter de lidar com eles. E prisioneiros especiais têm amigos influentes. Estarão permanentemente em evidência.
Têm também o tempo ao seu favor, quanto mais o tempo passar mais parecerá incoerente mantê-los presos.
 A proporcionalidade entre o delito e a pena é fundamental ao reconhecimento da justiça da condenação imposta.
 Em pouco começarão os pedidos de revisão de penas, elas realmente estão exageradas. Nem homicidas costumam receber penas tão elevadas.
Por que uma nova composição de Ministros do STF, passado o tempo necessário para distinguir dois momentos distintos, arcará com o ônus da falta de razoabilidade da formação anterior? Ao rever as penas, estará comprovado o justiciamento.
O mensalão do PSDB – o julgamento da AP 470, com o tempo, passará cada vez mais a se caracterizar como um tribunal de exceção. No que a expressão “tribunal de exceção” tem de pior.  Não poderá ser repetido.
O próximo evento com apelo midiático no STF será o julgamento do Mensalão Tucano.
O julgamento o mensalão do PSDB pode ser adiado até a prescrição da pena?  
Poder, pode – o governo FHC é um poço de casos de corrupção bem comprovados e mal resolvidos. Algum procurador da república propôs reabertura de casos como o da compra de votos da reeleição ou da Privataria Tucana? E creio, mesmo, que era essa a intenção – e ainda é, em grande parte. Mas com os prisioneiros do “mensalão do PT” cumprindo pena, torna-se cada vez mais difícil essa possibilidade.
Ocorre que o mensalão do PSDB é semelhante ao mensalão do PT. Mas serão julgados diferentemente.
Será um julgamento técnico.  Nele, a falta de provas não será vista como prova de culpa, nele não haverá “domínio do fato”. Nunca poderia ter ocorrido.
Nele não haverá o “junta quarenta no mesmo processo” e depois “fatia cada caso” para um julgamento separado por “núcleos”. Penas não serão somadas nem majoradas para garantir regime fechado.
Se na AP 470 isso já é absurdo, como repetir tais aberrações jurídicas no julgamento do Mensalão do PSDB? E, no entanto, não repeti-las tornará evidente o tribunal de exceção que foi a AP 470.
Poderemos conviver com tal hipocrisia?
As duas situações anteriores são certas, as próximas são uma possibilidade com maior ou menor grau de probabilidade.
Julgamento de Pizzolato na Itália – não creio na extradição de Pizzolato pela Itália.
Não sei como se daria um novo julgamento dele por uma corte Italiana. Mas, imaginemos que ele ocorra. Pizzolato parece estar bem municiado de documentos e, mesmo aqui, seu caso parece ter vários vieses não considerados pelo STF.  Até de ocultação e omissão de provas a seu favor por parte do Ministro Joaquim Barbosa se fala na internet.
Qual a chance de condenação?
Caso o julgamento italiano ocorra e Pizzolato seja inocentado, como ficaria sua condição de foragido na Interpol? Como ficaria sua condição jurídica no Brasil?
Inocentado, não ficaria patente a exceção do tribunal brasileiro?
Apelo à Corte Interamericana de Direitos Humanos – acho uma possibilidade distante, mas será tentada.
O caso de José Dirceu e José Genoino, por tudo que esses dois personagens têm de história, tem grande apelo político. Principalmente em uma América do Sul predominantemente de governos de esquerda.
A falta do duplo grau de jurisdição, contrariando justamente o "Pacto de San José da Costa Rica”, já é um forte motivo. Bastaria a Corte Internacional aceitar apreciar o caso, imediatamente se iniciaria a revisão do “julgamento do mensalão”.
Imprensa internacional – até agora, a repercussão internacional parece pequena e refletindo a ideia de condenação de corruptos. Casa bem com a visão do primeiro mundo sobre o Brasil.
Mas, se as duas situações anteriores ocorrerem, julgamento de Pizzolato na Itália e aceitação do apelo pela Corte Interamericana, com dois personagens tão emblemáticos como Dirceu e Genoino e dado o grau de “inovação” do julgamento da AP 470 o caso tem tudo para virar um romance de tribunal. Algo como a repercussão de alguns julgamentos de dissidentes chineses ou o que estamos vendo hoje na Rússia com o pessoal do Greenpeace.
É possível imaginar Joaquim Barbosa mandando jornalistas estrangeiros “chafurdar no lixo”?
Mensalão, um caso inacabado e sem esperança.
Ainda que nada disso ocorra, ainda que tudo isso ocorra, como poderemos evitar que, em breve, tenhamos em relação ao julgamento da AP 470 a sensação de que nada poderá coloca-lo no passado? A mesma falta de esperança que temos de que isso ocorra com os crimes da ditadura.

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