domingo, 23 de novembro de 2014

Em Volta Redonda, ainda

se combate a ditadura      

Habitantes do município fluminense têm a chance de homenagear um herói e retirar nome do ditador Medici de logradouro pública...
Paulo Cezar Soares              Carta Capital

Ponte
Audiência vai decidir se a ponte Emílio Médici passará a se chamar dom Waldyr  Calheiros Novaes
.Se depender do Ministério Público Federal (MPF) de Volta Redonda, cidade no interior fluminense   que  sedia a   Companhia  Siderúrgica Nacional (CSN),    mais um espaço público,    dos milhares espalhados   pelo Brasil,    deixará de carregar o nome de um ditador.   O Ministério Público Federal  encaminhou em outubro à prefeitura e à Câmara de Vereadores local  pedido de mudança na denominação de uma das principais pontes do município, batizada em 1973 de Emílio Garrastazu Médici, general identificado até a medula com as torturas e a repressão política dos 'anos de chumbo'. O procurador Júlio José Araújo Jr. sugere que um novo nome seja dado em 90 dias, por meio de discussão pública, com ampla participação da sociedade civil e baseada em normas constitucionais e legais.
Ainda em novembro, uma audiência pública será convocada para ouvir os moradores, afirma o presidente da Câmara de Vereadores, Washington Tadeu Granato Costa, do PTB. “Na audiência pública o tema vai ser debatido com integrantes da Comissão da Verdade e a população. Será feito um projeto de lei que, após votado em dois turnos, decidirá ou não pela troca.” Costa não disse se concorda com a alteração do nome da ponte. “Preciso ser imparcial.”
Se a população aprovar, sai  o ditador Garrastazu Médici e entra dom Waldyr Calheiros Novaes, bispo emérito da Diocese de Volta Redonda e Barra do Piraí, morto em 2013. D. Waldyr Calheiros protegeu perseguidos pelo regime, segundo as informações prestadas por 103 testemunhas à Comissão da Verdade montada no município. Para o historiador Edgar Bedê, a mudança do nome da ponte seria um reconhecimento à luta do religioso e sua  coragem na proteção aos injustiçados e perseguidos. “Ao mesmo tempo, a homenagem desqualificaria a reverência a um personagem marcadamente responsável por milhares de prisões, torturas, assassinatos e desaparecimentos no Brasil”, completa Bedê.
Professor aposentado, doutor em Educação pela Universidade Federal Fluminense, Bedê relembra dois episódios marcantes do conflito em Volta Redonda entre a Igreja e a ditadura durante o governo Médici. O primeiro foi no fim de 1970. “Na impossibilidade de prender o bispo, para não confrontar o Vaticano e criar uma crise com a Igreja Católica, os militares atacaram aqueles que o apoiavam. Prenderam 30 militantes da Juventude Operária Católica. Houve muitas torturas de prisioneiros, inclusive do padre Natanael Campos de Morais. Os militares do 1º Batalhão de Infantaria Blindada fizeram com o padre tudo aquilo que queriam fazer com dom Waldyr, e não podiam.
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A ponte, sobre o rio Paraíba do Sul,  que pode trocar de  homenageado
O segundo episódio, prossegue o historiador, ocorreria dois anos depois, em 1972, quando os familiares de soldados mortos e desaparecidos procuraram o bispo em busca de auxílio. “Após uma ação solidária e determinada pela busca da verdade, inclusive com o apoio da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, instalou-se um Inquérito Policial Militar do Alto Comando do Exército para apurar os fatos. Em meados de dezembro de 1971, no batalhão sediado em Barra Mansa, sob a justificativa de apurar o consumo e  o  tráfico de maconha no quartel, 15 soldados foram presos e torturados no pavilhão denominado ‘arquivo’. Quatro soldados morreram nas sessões de tortura. E ocorreu um fato inédito. Pela primeira vez a ditadura reconheceu a prática de tortura em um quartel do Exército. E condenou os torturadores. Dom Waldyr teve papel decisivo para o processo chegar ao fim e punir os responsáveis. Foi uma grande vitória contra a repressão. Tudo isso no auge da tirania do governo Médici.”
Após o fim da ditadura, o bispo manteve a sua atuação política, sempre em defesa dos perseguidos e necessitados. Entre outras, apoiou a greve dos ferroviários da CSN, em 1988, quando três trabalhadores foram mortos pelo Exército.
Se não conseguirem identificar torturadores, muito menos levá-los aos tribunais, comissões da verdade municipais como essa de Volta Redonda podem ao menos homenagear os verdadeiros heróis do País. Trocar o nome da ponte seria um sinal em favor da paz, contra a violência e a covardia. A escolha está nas mãos dos moradores da cidade.
Dom Waldyr Calheiros Novaes  nasceu em Murici(AL)  em 29/07/1923,  e    faleceu  em Volta  Redonda(RJ),      em   30/11/2013,     de  cuja diocese católica –  conjunta  com Barra do Piraí -   foi titular por 33 anos.  Ficou conhecido por seu engajamento   nas   lutas sociais    em favor  dos menos favorecidos,  como  o  movimento  dos   posseiros e   o movimento sindical,    Dom Waldyr   jamais    negou abrigo e   apoio a  todos  os  perseguidos  políticos   que buscaram sua ajuda.                                                        
Lutou  desde sempre pelos direitos dos  trabalhadores e de todos os   segmentos   oprimidos  da população  brasileira,    estendendo   seu apoio   às  lutas de   outros   povos   pela liberdade    e  pelo   fim   da  exploração econômica da força de trabalho.             
Dom Waldyr   teve atuação   marcante no triste   episódio   do   dia 9 de  novembro de 1988, quando as tropas do Exército   invadiram   a    Companhia     Siderúrgica Nacional, matando três operários e deixando outros 40 feridos.                                 

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