Marina e A FALÁCIA DA 'Terceira Via'
Blog do Paulo Moreira Leite - Brasil247
A 'escolhida dE DEUS' EM TRANSE MESSIÂNICA? |
Enquanto Marina Silva caminha para sua segunda candidatura presidencial, a ser oficializada pelo PSB nos próximos dias, seus aliados fazem o possível para apresentá-la como concorrente da chamada 'terceira via'.
Imaginar
que Marina Silva pode ser enfeitada com características que envolvem uma
concepção peculiar de luta política, um método de alcançar seus objetivos — e
não apenas traços de personalidade — pode até ajudar o esforço de quem procura
transformar a ex-ministra do Meio Ambiente em herdeira natural de Eduardo
Campos, político conhecido pela capacidade de agregar e somar.
Mas também ajuda a alimentar uma ilusão, apoiada mais
em aparência do que em consistência. Para ser uma verdadeira “terceira” opção
entre dois pólos, seria preciso imaginar Marina numa posição equidistante entre
PT e PSDB. É claro que isso está longe de acontecer. Com ela, o PSB pode até
pegar o lugar de Aécio Neves num eventual segundo turno mas estará cada vez
mais perto do PSDB. Não temos três vias. Mas 2 vias contra 1.
Marina deixou o governo Luiz Inácio Lula da Silva em
maio de 2008. Sua saída foi apresentada na época por Paulo Adário, diretor de
Campanhas do Greenpeace, como uma prova do “descaso do governo Lula com a causa
ambiental e também com a proteção da Amazonia.” Na realidade, Lula abriu a
porta de saída para Marina quando se convenceu que ela passara a utilizar o
ministério para pavimentar sua própria candidatura presidencial em vôo
individual, à margem de suas articulações, que conduziram ao lançamento da
candidatura Dilma Rousseff.
O
lance final que levou Marina a deixar o governo foi um ato de desprestígio –
Lula entregou para Roberto Mangabeira Unger, ministro sem nenhuma base política
maior, a coordenação do Plano Amazonia Sustentável, no qual Marina estivera
envolvida profundamente por um longo período. Essa decisão foi o lance final de
uma sucessão conflitos marcados por uma postura que pode ser definida com
várias palavras – mas nunca pelos termos empregados para falar do estilo
Eduardo Campos ou mesmo de Luiz Inácio Lula da Silva.
Dias
antes, os aliados de Marina haviam transformado uma Conferência do Meio
Ambiente, em Brasília, num ato de lançamento informal de sua candidatura,
improvisando um coro “Marina Presidente” que causou surpresa em muitos dos
presentes – e ajudou a entender porque na última hora o próprio Lula cancelou
sua aparição no evento.
A
primeira grande concessão de Lula a Marina terminou em decepção, na verdade.
Envolvia o poder de deliberação no Comissão Nacional Técnico de Biossegurança,
criada em 2005, com função de dar a palavra final sobre tudo o que envolve
saúde humana, organismos vivos e meio ambiente. Atendendo a um pleito da então
ministra do Meio Ambiente, Lula assegurou que seus dois representantes naquele
órgão teriam o poder de voto sobre decisões, mesmo que tomadas por maioria. A
ideia era criar um clima para forçar a negociação e o acordo. Não funcionou. Os
representes do Meio Ambiente preferiam vetar a negociar, provocando uma revisão
no estatuto do CNTBio que diminuiu o poder de barganha dos ambientalistas.
Quando
o governo foi discutir a construção da usina de Santo Antonio, no Rio Madeira,
apareceram dois debates relevantes, embora de natureza diferente. Um deles,
envolvia o nível de retenção da represa, que poderia comprometer os
reservatórios planejados. O outro, envolvia a sobrevivencia de um tipo de
bagre, característico do Madeira. Estudos técnicos mostraram que era possível
encontrar soluções aceitáveis para os dois problemas – mas Marina atuou no
sentido de criar impasses duradouros em vez de abrir o caminho para soluções,
postura que lembrava o que ocorria no governo Fernando Henrique, quando causas
ambientalistas eram usadas para esvaziar investimentos públicos capazes de
comprometer a (SUPOSTA) política de 'austeridade' do ministro da Fazenda Pedro Malan.
Essa
postura se radicalizou após a saída de Marina do governo. Ela se distanciou do
pensamento economico desenvolvimentista, que está na origem dos esforço para
elevar o progresso humano e distribuir renda, para aproximar-se de economistas
que priorizam o mercado, para quem a preservação da natureza serve de argumento
para paralisar o crescimento e diminuir o consumo, postura que num país como o
Brasil, gera as consequencias ruinosas que todos conhecemos.
Num país marcado pela nefasta tradição do pensamento
único, a campanha de 2014 apresenta uma situação incomum de polarização
política, marcada por candidaturas que, bem ou mal, com nitidez maior ou menor,
expressam o conflito de grandes interesses presentes na sociedade – pobres
contra ricos, 99% contra 1%, e assim por diante.
Você
não precisa achar que um dos lados só faz o que é certo. Não. Muitas vezes
erra, por incompetência, por falta de visão, pelas duas coisas, também. Mas é
preciso compreender que, conforme o seu ponto de vista, uma vitória do outro
lado trará, necessariamente, resultados ainda piores para os interesses que
você julga mais importantes.
Diversos comentaristas costumam deplorar essa divisão do eleitorado com frases
sentimentais, cultivando a mitologia do “governo para todos”, acima dos grandes
conflitos — como se isso fosse possível na vida real e não somente no palanque.
Mas eu não acho que a polarização seja um processo necessariamente ruim, pois
lembra que nosso sistema político não pode ser concebido como uma geléia.
Ajuda o eleitor a participar de uma eleição que não é um concurso de
personalidades nem torneio de retóricas belas e vazias — mas uma disputa em
torno de prioridades e interesses profundos. A questão é saber quais interesses
podem falar pelo conjunto da sociedade e trazer benefícios para a maioria. Este
é o ponto.
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