sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

Coisa da ‘Lava Jato’: banco  emite (errado?)  cheque  de  meio bilhão  para filha do delator da Petrobras 

Diz o ditado popular que quando a esmola é demais, o santo desconfia. Mas nem sempre, como mostra a reação da filha de Paulo Roberto Costa ao receber um cheque do Bradesco com três zeros a mais...
Helena Stephanowitz                          
REPRODUZIDO DO 'TIJOLAÇO'
Cheque errado
O Bradesco atribuiu a um funcionário o preenchimento de um cheque administrativo no valor errado de R$ 500 milhões, emitido pelo banco em 30 de dezembro de 2014 para Arianna Azevedo Costa Bachmann, filha do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, flagrado em negócios com Alberto Youssef e que confessou ter recebido propinas milionárias de grandes empreiteiras. O cheque só foi devolvido após o Bradesco exigir a devolução na Justiça.
Arianna já foi denunciada pelo Ministério Público Federal pelo crime de sumiço e ocultação de provas do escritório do pai. Filhas e genros de Costa também são investigados pela participação em empresas e contas no exterior que teriam recebido dinheiro da propina, segundo o MPF. Ela consta como sócia com participação de 40% na empresa de consultoria Costa Global do pai, e teve bens bloqueados.
Segundo explica seu advogado, em 30 de dezembro de 2014, último dia de expediente bancário do ano, ela resgatou R$ 650 mil de um de um plano de previdência privada na agência Bradesco do Largo da Carioca, Rio de Janeiro. O advogado diz que esses recursos não estariam bloqueados pela Justiça.
Outro ex-diretor da Petrobras investigado na mesma operação, Nestor Cerveró, teve pedido de prisão motivado, entre outras coisas, devido a um resgate de quase meio milhão de reais do plano de previdência privada dele. Novamente o banco atribuiu o erro a um funcionário.
Voltando a Arianna. Para  sacar os valores, ela pediu dois cheques administrativos (cheque emitido pelo próprio banco), um de R$ 150 mil e outro de R$ 500 mil. O segundo foi emitido em um valor mil vezes maior, de R$ 500 milhões.
Porém, o erro passou pelo menos por dois outros funcionários que checaram e assinaram o cheque. Não é impossível, dada a pressão a que bancários são submetidos em seu trabalho, mas é raríssimo, senão inédito, que um cheque com erro tão grande saia da agência sem que desperte a atenção de pelo menos um dos três funcionários, dois deles graduados, com poderes para assinar cheques de valores elevados.
Por outro lado, também seria inédito se este cheque fosse descontado com sucesso, pois além de ser grande a chance de recusa no processo de compensação, um rombo de meio bilhão desequilibra qualquer balanço de um fundo de previdência privado. Arianna também diz não ter percebido o erro na hora, só notando no dia 3 de janeiro, sempre segundo seus advogados.
Em vez de ela devolver o cheque errado tão logo percebeu, e pedir outro no valor correto, seu advogado Raphael Montenegro disse ter pedido uma reunião com o Bradesco para tratar da devolução, enquanto o banco fazia uma auditoria no caso. Segundo ele, o medo de Arianna era de que o cheque fosse interpretado pelo Ministério Público como movimentação de recursos ocultados da Justiça, com anulação da delação premiada de Paulo Roberto Costa e perda de benefícios na redução da pena.
Porém, ela não explicou porque simplesmente não comunicou o ocorrido ao Ministério Público Federal tão logo percebeu, pedindo até que os procuradores da República acompanhassem a devolução do cheque na agência para não restar mal-entendidos, em vez de pedir reunião a portas fechadas com o Banco.
Na segunda-feira (26), houve a reunião. Ainda na segunda, o Bradesco acionou a Justiça para apreensão do cheque na casa de Arianna, alegando que a cliente se recusara a substituir o cheque. O banco pediu sigilo de justiça, mas não foi atendido neste ponto. O mandado de busca foi autorizado no dia seguinte (27), em caráter de urgência.
O cheque foi devolvido na quinta-feira (28), em juízo. Outro advogado de defesa, João Mestieri, afirmou que Arianna procurou o banco para devolver, mas a divergência foi não concordar em fazê-lo de maneira informal, exigindo que a troca fosse documentada. De novo, faltou explicar sobre o porque de pedir reunião com o banco em vez de recorrer ao Ministério Público para acompanhar oficialmente a troca.
É o segundo erro do Bradesco que aparece no contexto da operação Lava Jato. Outro investigado, o ex-diretor Cerveró, anunciou por meio de seu advogado, que processará o banco por ter informado errado ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf, subordinado ao Ministério da Fazenda com encarregado de combater operações suspeitas) um saque de R$ 200 mil em espécie de uma usina de etanol em 2011, mas que nada tinha a ver com ele. O Bradesco reconheceu que trocou o nome do titular do saque. Apesar de Cerveró ter contra si outras evidências, esta foi uma das movimentações financeiras que lhe trouxeram complicações.
Pode ser tudo um erro burocrático do banco e de condução dos advogados, mas diz o ditado popular que quando a esmola é demais, o santo desconfia. Pois se o erro é demais, também. Principalmente em se tratando de pessoas envolvidas em uma investigação como a da Operação Lava Jato, que mexe com grandes interesses, afetando até cotações nas Bolsas de Valores.

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