segunda-feira, 6 de abril de 2015

Fernando Henrique afunda


no udenismo: 1964 só foi 


autoritário 'depois'



Fernando Brito  
A vaidade de Fernando Henrique Cardoso retira-lhe, de forma crônica, a prudência de quem se dedica à política, mais ainda quando sua formação intelectual deveria ensinar-lhe que as superfícies da opinião pública, como o mar nas tempestades, agitam-se, fluem e refluem.
No seu artigo de ontem, FHC, tal como sentou-se na cadeira de Prefeito de São Paulo às vésperas de ser derrotado por Jânio Quadros, já convida a oposição (embora não deixe claro qual é seu conceito de oposição e se ela inclui Renan Calheiros e Eduardo Cunha, cabeças do controle conservador do Congresso, e lhes estenda um dedinho, ao dizer que o PMDB, “também tem propostas a serem consideradas”) a já preocupar-se com a “reconstrução” da política e da economia do país.
Mas não neste governo, deixa logo claro: antes, é preciso “passar o país” a limpo. Mesmo que seja evidente a hipocrisia ao dizer que “não há pressões institucionais para derrubar o governo e todos queremos manter a democracia”, ao colocar-se frontalmente contra qualquer diálogo com “o governo que não deve ser salvo”, mostra onde está a sua aposta.
Apresenta, então, “propostas institucionais” a adotar enquanto o governo se derrete: voto distrital – os cariocas mais antigos devem lembrar-se do tempo em que ele existia semioficialmente aqui, com a política da bica d’água de Chagas Freitas – entrega do pré-sal, uma “nota fiscal”  nacional e, pasmem, um tabelamento da propina, com a imposição de um “teto” de R$ 800 mil para que as empresas financiem campanhas.
Do ponto de vista prático, como quase tudo o que diz, o artigo de Fernando Henrique é um longo nada.
Mas tem algo muito interessante no conceito que, distraidamente, deixa escapar, como deixou, pouco antes de sua posse como presidente, em 1995, sair a frase sobre acabar com a Era Vargas.
Diz, ao analisar o “populismo” com aquelas luvas de borracha que seu nojo elitista faz calçar, que “em 1964, as ‘marchas das famílias pela liberdade’ aglutinaram as forças políticas aos militares contra o populismo presidencial e, posteriormente, se entregaram a práticas autoritárias.
Posteriormente, Doutor? Derrubar um presidente eleito com tropas não seria prática autoritária?
Ou seria democrático tomar o poder e baixar Atos Institucionais a seguir, proclamando a ditadura “branda”, como se expressa no preâmbulo do primeiro deles?
” Para demonstrar que não pretendemos radicalizar o processo revolucionário, decidimos manter a Constituição de 1946, limitando-nos a modificá-la, apenas, na parte relativa aos poderes do Presidente da República, a fim de que este possa cumprir a missão de restaurar no Brasil a ordem econômica e financeira e tomar as urgentes medidas destinadas a drenar o bolsão comunista, cuja purulência já se havia infiltrado não só na cúpula do governo como nas suas dependências administrativas. Para reduzir ainda mais os plenos poderes de que se acha investida a revolução vitoriosa, resolvemos, igualmente, manter o Congresso Nacional, com as reservas relativas aos seus poderes, constantes do presente Ato Institucional”.
O PSDB, como a UDN, não mais chega ao poder pela democracia.
É por isso que FHC aceita intimidades com os fantasmas de 64, com os quais faz hoje causa comum.

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