Prevenção à corrupção, transparência e proteção
à fonte de informação
(das
sugestões do Ministério Público Federal encaminhadas ao Congresso Nacional)
No Brasil de hoje, ainda é possível perceber, em alguns setores da sociedade, um círculo vicioso de corrupção nas esferas privada e pública. Embora não se deva incorrer em generalizações, causa profundo desconforto à sociedade brasileira a constatação da existência de um desvio comportamental em que, de um lado, alguns particulares aceitam a corrupção como um modo de fazer negócios, enquanto, de outro lado, agentes públicos aceitam a corrupção porque foram empregados para “garantir a propina de quem os colocou lá” ou porque querem “garantir a sua participação no “esquema”.
O
processo de justificação do corrupto perante o tribunal de sua consciência é chamado
pela psicologia de racionalização e
pela criminologia de neutralização.
O
contexto em que isso acontece é o de uma cultura hedonista(*), patrimonialista e
de quebra de paradigmas pós-modernistas em que cada um faz o que acha certo aos seus próprios olhos.
Mudar
esse cenário é possível. De um país extremamente corrupto, Hong Kong, por
exemplo, passou ao 17º (décimo sétimo) mais honesto no ranking de percepção da
corrupção da Transparência Internacional, por meio de uma estratégia de combate
à corrupção que pode ser resumida em três frentes: 1) investigação e punição
efetivas da corrupção; 2) implementação de controles internos, transparência,
auditorias, estudos e pesquisas de percepção; e 3) educação, conscientização e
marketing. O primeiro “slogan” da agência anticorrupção de Hong Kong foi
“denuncie a corrupção”.
Para
quebrar o círculo vicioso ainda existente no Brasil, o Ministério Público Federal,
buscando participar desse importante debate cívico, propõe algumas mudanças
legislativas, com o propósito de aprimorar nossos mecanismos de enfrentamento
da corrupção e de reduzir o sentimento de impunidade.
A
primeira visa à transparência, por meio da criação da regra de accountability(**) e eficiência do Ministério Público e do Poder
Judiciário. Trata-se de um gatilho de eficiência. É estabelecido um marco de
duração razoável do processo, consistente na duração de dois anos em primeira
instância e um ano para cada instância diversa. Os Tribunais e os Ministérios
Públicos são orientados a fazer estatísticas sobre a duração do processo em
cada órgão e instância, bem como a encaminhar os dados para o CNJ e CNMP, a fim
de que esses órgãos possam avaliar as medidas cabíveis, inclusive legislativas,
que devam ser propostas, a fim de se alcançar a razoável duração do processo.
Outra
proposta é a previsão da possibilidade da realização de testes de integridade,
isto é, a “simulação de situações, sem o conhecimento do agente público ou
empregado, com o objetivo de testar sua conduta moral e 1predisposição para
cometer crimes contra a Administração Pública”. A realização de tais testes
pode ser feita por órgãos correicionais e cercada de cautelas, incluindo a
criação de uma tentação comedida ao servidor, agravação audiovisual do teste e
a comunicação prévia de sua realização ao Ministério Público, o qual pode
recomendar providências. O pressuposto desses testes não é a desconfiança em
relação aos agentes públicos, mas sim a percepção de que todo agente público
tem o dever de transparência e accountability,
sendo natural o exame de sua atividade. A realização desses testes é
incentivada pela Transparência Internacional e pela ONU.
A
terceira proposta determina o investimento de um percentual entre 10 e 20% dos
recursos de publicidade dos entes da Administração Pública em ações e programas
de marketing voltados a estabelecer uma cultura de intolerância à corrupção,
conscientizar a população acerca dos danos sociais e individuais causados por
ela, angariar apoio público para medidas contra corrupção e reportar esse
crime.
Por
fim, a última proposta torna expressa, em nível infralegal, a possibilidade prevista
no art. 5º, XIV, da Constituição Federal, de o Ministério Público resguardar o
sigilo de fonte quando essa medida for necessária para que um cidadão reporte
corrupção, para a proteção do noticiante, ou por outra razão de relevante
interesse público. Embora evidente, é ressalvado expressamente que ninguém pode
ser condenado apenas com base na palavra de informante confidencial. Prevê-se,
ainda, a possibilidade de ser revelada a identidade do informante a fim de que
responda pelos crimes praticados quando fizer falsa imputação.
Do AMgóes - (*) HEDONISTA:
indivíduo que prioriza o prazer e a supressão da dor como objetivo de vida(do grego ‘hedonê’(prazer,
vontade). (**) ACCOUNTABILITY: responsabilização pessoal pelos atos
praticados e explicitamente a exigente prontidão para a prestação de contas,
seja no âmbito público ou no privado.
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