Há uma preciosidade política entre as falas do Papa Francisco, nessa quarta-feira(8).
Não, não foram os elogios feitos à Bolívia, em sua chegada àquele país, pela inclusão social e a diversidade, expressa até no nome “Estado Plurinacional da Bolívia”. Todas muito importantes, por certo.
Foi antes de embarcar para lá, ainda no Equador.
No finalzinho da matéria de O Globo(A Q U I), narrando suas atividades com Evo Morales, ficou o registro de Francisco no santuário de La Virgen de El Quinche, a 30 quilômetros de Quito, capital equatoriana, onde pediu a padres e bispos que cuidassem do “Alzheimer espiritual” que faz a Igreja esquecer dos mais humildes.
— Tomem cuidado para não cair em uma doença que é bastante perigosa para quem o Senhor amou gratuitamente ao segui-lo ou ao servi-lo: não caiam no 'Alzheimer espiritual', não percam a memória de onde vieram...
Ateu, como sou, começo a achar que Francisco corre o risco de me transformar em “papista”, no sentido de adepto do papa.
Porque a observação é preciosa para todos os que pensamos numa política popular e progressista para o Brasil e que vemos, ao longo do caminho da vida, formar-se um “Alzheimer social”, onde nos esquecemos de onde viemos e quem nos colocou onde estamos.
Este terrível mal é mais frequente do que se imagina e não tem a ver, apenas, com uma vida menos sacrificada e com um pouco mais de folga material.
Tem a ver com a imersão num meio que não guarda muita – ou nenhuma – semelhança com a vida real das pessoas mais simples.
Começamos a absorver, por vezes inconscientemente, a ideologia dos adversários.
Somos “politicamente corretos” e temos “frisson” com quem não é, mas somos socialmente cruéis: começamos a achar que certas diferenças de direitos são “naturais” e que os pobres são quase uma “subespécie”, da qual, entretanto, podem sair alguns, por uma seleção “natural” algo darwiniana.
Nós mesmos, talvez, nos encaixemos neste conceito, pois “vencemos”, vindo de lá, por nossas habilidades, espertezas, competências.
Talvez, o que tenha querido dizer o Papa aos religiosos devamos dizer a nós mesmos: “não percamos a memória de onde viemos”.
Não é “moderno”, não é “vanguarda”, não é up-to-date.
Mas é telúrico, é como uma seiva, um caldo imaterial de energia, que nos faz mais fortes e resistentes.
Nunca desprezemos a força do povo, que tem um poder que lhe vem das entranhas, puro, vulcânico, que atemoriza tanto os donos do mundo e do Brasil que eles vivem montando um infinito de patranhas para que este povo se confunda e fique inerte.
Chegar ao Governo é muito, mas é quase nada quando se contrai o “Alzheimer social”, porque já não sabemos quem somos e aqueles em que nos transfiguramos já não sabemos amar, servir ou seguir aqueles de onde viemos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário